Por Daniel Pereira
O mundo desportivo está conturbado desde domingo, dia 18 de abril, com a informação da iniciativa de alguns ricos – e não grandes – clubes europeus em viabilizar uma provável “Super Liga da Europa”, uma competição continental maior e mais importante que a UEFA Champions League. Felizmente muitos grandes jogadores e ídolos dos mesmos clubes conspiradores rapidamente vieram a público demonstrar repúdio à tal iniciativa, um completo descalabro.
Como era de se esperar, o debate sobre a super liga gira unicamente em torno de dinheiro, finanças. Sobre como os clubes europeus mais ricos poderiam arrecadar mais dinheiro, através de engajamento midiático e esportivo, etc. Não passa pela cabeça das pessoas, principalmente dos donos e acionistas de tais clubes, que o futebol não é, nunca foi e nunca será um mero esporte ou entretenimento, como o atletismo, o basquetebol, dentre outros desportos olímpicos. Historicamente, antes mesmo de sua padronização pelos ingleses, o football é um desporto simples de ser praticado, divertido e inclusivo. Esse é seu segredo: uma simples esfera, um punhado de amigos e a vontade de se divertir e passar o tédio.
Com a padronização e mais tarde sua profissionalização, o futebol tomou novas proporções sociais. Simplesmente tornou-se “a coisa mais importante dentre as menos importantes”, como diz Milton Neves, fervoroso apreciador, cronista e mantenedor da memória do futebol brasileiro. O desenvolvimento do futebol no mundo inteiro, principalmente nos locais onde é historicamente forte, é praticamente o mesmo: um desporto praticado inicialmente a nível local, com times e clubes formados e fundados inicialmente por operários, vizinhos ou amigos, que com o passar do tempo, tomaria status regional e nacional, a ponto de novos clubes surgirem inspirados nos primeiros ou nos que se sobressaíram em tais polos.
Infelizmente os “europeus” esqueceram de suas origens e agora almejam o mundo de maneira precipitada. Clubes conspiradores como Liverpool e Manchester United acabam de jogar suas próprias histórias no lixo ao aderir à essa palhaçada. Rapidamente ao surgimento do debate, tem-se lido em alguns lugares a “globalização extrapolada do futebol”, que isso faria parte do tal “Great Reset” proposto por grandes corporações financeiras. Sem querer negar ou discorrer sobre o tal “Great Reset”, sou da opinião de que tais clubes simplesmente optaram, de maneira precipitada, pelo modelo ianque de gestão esportiva, como é praticado em ligas como a NBA, a NFL, a NHL, etc. Basicamente esse modelo visa o máximo possível de lucro, estimulando a competitividade. O que os 12 ricos clubes europeus conspiradores não sabem ou simplesmente ignoram é que tal modelo possui mecanismos de autocorreção, como o draft. Mas cabe alertá-los a respeito das particularidades do futebol. No futebol há mecanismos/normas de autocorreção e competitividade como o REBAIXAMENTO e a classificação via títulos ou campeonato nacional. O que os danados desses 12 espertinhos clubes querem é vaga cativa(!) na tal super liga. Ou seja, não importa se os chineses administraram o AC Milan como uma padaria durante sete temporadas consecutivas, impedindo o clube de disputar a Champions League durante esse tempo todo; o que importa é que o Milan quer atrair a renda de torcedores asiáticos e pra isso bastaria apenas PAGAR para sempre jogar a tal super liga. Algo completamente descabido no futebol. Meritocracia zero.
Defendo a adaptação do modelo ianque para o futebol, porém de maneira saudável e orgânica, para que o desporto como um todo possa usufruir disso. Todos ganham: os torcedores, os atletas, as emissoras, os patrocinadores e os clubes. O futebol também possui responsabilidade social e sempre quando uma liga moderniza-se, todos ganham. Dos clubes menores aos maiores/ricos. É saudável e bom quando o Leicester e o Leeds permanecem na Premier League com possibilidade de título. Quando o Real Sociedad e o Sevilla beliscam títulos.
Quando o Ajax encaixa um time jovem e vai longe na Champions League. O futebol e seus admiradores agradecem. Por favor, gananciosos. Não destruam o futebol, o mundo agradece.