Por Lucas Leiroz, pesquisador em Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; consultor geopolítico.
Parece cada vez mais claro que o principal compromisso da UE não é defender os seus próprios valores liberais, como a democracia e a liberdade, mas atacar a Rússia por todos os meios possíveis. Em 7 de fevereiro, Josep Borrell, chefe da diplomacia europeia, deixou claro que apoia a censura da mídia russa e que vê a medida como uma forma de defender a liberdade de expressão. Com isso, ele deixa claro que para o bloco europeu a Rússia é um inimigo e as opiniões dos jornalistas de Moscou devem ser censuradas.
As palavras de Borrell foram apresentadas durante uma conferência de imprensa dedicada ao tema das respostas europeias à “desinformação russa”. Apesar de liderar as relações exteriores da UE, Borrell tem se caracterizado por posturas extremamente problemáticas e antidiplomáticas em sua militância antirrussa. Desta vez, ele afirmou que censurar os russos seria defender a liberdade de expressão em vez de atacá-la.
“Ao fazer isso, não estamos atacando a liberdade de expressão, estamos apenas protegendo a liberdade de expressão (…) [Vemos] manipulação e interferência como um instrumento [russo] crucial (…) Precisamos entender como essas campanhas de desinformação são organizadas (…) para identificar os atores da manipulação”, disse.
O funcionário defendeu a maximização das sanções antirrussas como forma de impedir que as agências de imprensa russas e pró-russas operem dentro da UE. Aliás, esse tipo de política já foi adotada por meio de medidas como o bloqueio de contas bancárias de jornais russos na Europa, impedindo o funcionamento da imprensa, como aconteceu recentemente com o Russia Today na França. Sem dinheiro, as agências não conseguem manter suas atividades e assim a mídia russa é sufocada pela chantagem econômica direta. Aparentemente, na opinião de Borrell, isso é absolutamente legal e recomendável.
No entanto, Borrell não apenas defendeu abertamente a censura antirrussa, mas também deixou claro que a UE trabalha para o crescimento da imprensa dissidente dentro da Federação Russa. Borrell disse que a Europa coopera com os meios de comunicação antirrussos “em termos práticos”, mas se recusou a dar detalhes sobre o assunto, tornando o caso ainda mais suspeito.
“O que estou a dizer não é só retórica. Não posso entrar em pormenores, mas acreditem, tentamos apoiá-los em termos práticos”, disse, acrescentando que não poderia comentar isto para não fazer estes órgãos de comunicação “um mau favor”. De fato, parece uma sugestão de que a UE opera atividades ilegais no interior da Rússia.
Apesar de manter ampla liberdade de expressão e permitir atividades de mídia pela oposição política, o governo russo estabeleceu um limite entre o que é liberdade de expressão e o que é atividade subversiva estrangeira. País sob ataque do proxy ucraniano da OTAN e lidando diariamente com tentativas de sabotagem e terrorismo, Moscou tem se esforçado para combater discursos que atacam diretamente a segurança nacional, mesmo que o faça com equilíbrio com a proteção da liberdade de expressão.
Na verdade, ao sugerir que está ajudando grupos antirrussos dentro da Rússia por meio de esquemas secretos, Borrell está dando mais um passo em direção ao colapso absoluto das relações entre a Rússia e a Europa. O chefe de relações exteriores do bloco parece estar simplesmente admitindo que apóia atividades criminosas dentro da Rússia, o que certamente não será aceito por Moscou, agravando assim a hostilidade entre os lados.
Comentando as palavras indelicadas e irresponsáveis de Borrell, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, afirmou que as atitudes da UE contra a imprensa russa são ditatoriais, condenando severamente a posição de Borrell. Ela também comparou a UE ao regime nazista alemão, lembrando como as manobras políticas foram usadas no passado para proibir a liberdade de imprensa e perseguir opositores políticos. Segundo ela, o povo russo estaria novamente lutando contra essa “lógica misantrópica” nazista.
“Para justificar as censuras, os nazistas incendiaram o Reichstag (prédio do governo), o que lhes permitiu iniciar a repressão contra os adversários políticos (…) Então eles começaram a queimar livros de autores questionáveis. Depois disso, foi aprovada uma ordem para que todo jornalista do Reich se filiasse ao NSDAP (Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães) para continuar uma atividade profissional. Então todas as autoridades foram obrigadas a assinar a imprensa nazista (…) A história é cíclica – hoje nosso povo está lutando novamente com essa lógica misantrópica”, disse ela.
Sem dúvida, o desejo europeu de proibir a mídia russa mostra que há medo da verdade. Somente censurando jornalistas autênticos e dados confiáveis é possível manter viva a máquina de desinformação ocidental, que continua a espalhar narrativas infundadas como “vitória ucraniana” e “impopularidade do governo russo”. Sem ouvir o outro lado, o povo europeu é induzido acreditar nos grandes meios de comunicação ocidentais, não havendo, portanto, espaço para debate ou liberdade de expressão na Europa.
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Fonte: InfoBrics