Há vantagens e desvantagens na possível adesão da Turquia ao bloco de economias emergentes
Por Murad Sadygzade.
No início deste mês (junho de 2024), a notícia do desejo da Turquia de se juntar ao BRICS chamou a atenção da mídia global. O anúncio foi feito pelo Ministro das Relações Exteriores da Turquia, Hakan Fidan, durante sua visita à China. “É claro que gostaríamos de nos tornar um membro do BRICS. Vamos ver o que podemos conseguir este ano”, disse o ministro, conforme citado pelo South China Morning Post.
Essa questão também foi discutida na reunião dos ministros das Relações Exteriores do BRICS em Nizhny Novgorod, com a presença do diplomata-chefe da Turquia, Hakan Fidan. O desejo da Turquia de entrar não é totalmente novo – durante a cúpula do BRICS de 2018, da qual o líder turco Recep Tayyip Erdoğan participou, o presidente russo Vladimir Putin disse que Ancara poderia entrar em 2022. No entanto, os eventos subsequentes no cenário mundial aparentemente atrasaram essa ambição, e Ancara só agora está demonstrando interesse renovado.
O que é são os BRICS?
O BRICS é uma associação internacional composta inicialmente por cinco grandes economias em desenvolvimento: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Estabelecida para aprimorar a cooperação e fortalecer as posições globais, seu nome vem das letras iniciais dos nomes dos Estados membros.
O conceito começou em 2001, quando Jim O’Neill, analista do Goldman Sachs, cunhou o termo “BRIC” para as principais economias de crescimento mais rápido na época: Brasil, Rússia, Índia e China. A primeira reunião formal ocorreu em 2006 na Assembleia Geral da ONU. A primeira cúpula do BRIC foi realizada em Ecaterimburgo (Rússia) em 2009. A África do Sul se juntou a eles em 2011, formando o BRICS. A partir de 1º de janeiro de 2024, Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos também aderiram.
O BRICS tem como objetivo promover o crescimento econômico, fortalecer o comércio e os investimentos, desenvolver a infraestrutura e manter a estabilidade financeira por meio de mecanismos como o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) e o Acordo de Reserva Contingente (CRA). Ele busca maior participação em instituições internacionais, como o FMI e o Banco Mundial. O BRICS também se concentra na cooperação científica e técnica em energia, medicina e agricultura.
A associação fortalece os laços econômicos, contribuindo para o desenvolvimento e o comércio entre as partes. Ao fornecer fontes alternativas de financiamento, ela reduz a dependência das instituições financeiras ocidentais. Os países do BRICS trabalham juntos para defender seus interesses e promover uma ordem global mais equitativa. Eles também enfrentam desafios globais, como mudanças climáticas e pandemias.
O BRICS é único devido à diversidade de seus membros, que abrangem diferentes continentes e culturas. Sem estruturas legais rígidas, ele permite uma ação flexível focada na cooperação prática e em projetos específicos para melhorar a vida dos cidadãos. Isso atrai mais países não ocidentais para participar da associação.
BRICS vs G7
Com o aumento do confronto entre os países da maioria global e o Ocidente, considera-se que os BRICS estão surgindo como uma alternativa ao G7. Isso é determinado por vários motivos importantes relacionados a aspectos econômicos, políticos e sociais. O G7, composto pelos principais países economicamente desenvolvidos – EUA, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Japão – tradicionalmente dominou a arena internacional, moldando a agenda econômica e política global. No entanto, o surgimento e o desenvolvimento dos BRICS mudaram esse equilíbrio, oferecendo uma visão alternativa sobre a governança e a cooperação globais.
Os BRICS reúnem as maiores economias em desenvolvimento do mundo, que, juntas, respondem por uma parcela significativa do PIB e da população globais. Coletivamente, os países do BRICS possuem vastos recursos e potencial de crescimento econômico, o que os torna atores importantes no cenário global.
Para entender melhor, vamos comparar alguns indicadores. Com seus cinco novos membros, os BRICS agora representam quase 34% da área terrestre do mundo, enquanto o G7 representa 16%. Os países do BRICS abrigam 45,2% da população mundial, em comparação com apenas 9,7% do G7. O PIB combinado com base na paridade do poder de compra dos países do BRICS é de 36,7% do total global em 2024, em comparação com 29,6% do G7. Os dados sobre as reservas de petróleo mostram que os países do BRICS agora detêm 45,8% dos volumes globais, enquanto o G7 detém apenas 3,7%.
Assim, em muitos aspectos, os BRICS superam o G7. O poder econômico dos BRICS permite que esses países proponham modelos alternativos de desenvolvimento e cooperação econômica, diferentes das abordagens ocidentais representadas pelo G7.
Devido às contradições internacionais e à hegemonia destrutiva dos países ocidentais liderados por Washington, as questões sobre a necessidade de transformar a ordem mundial estão surgindo ativamente. Os BRICS defendem um mundo multipolar, no qual o equilíbrio de poder é distribuído de forma mais equilibrada entre várias regiões e países. Enquanto o G7 representa os interesses das potências ocidentais economicamente desenvolvidas, os BRICS se concentram nas questões e nos interesses das nações em desenvolvimento, que geralmente são marginalizadas na política global. Isso faz dos BRICS uma plataforma importante para os países que buscam maior autonomia e independência da influência ocidental.
Além disso, a criação do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) e do Arranjo Contingente de Reservas (CRA) demonstra o desejo dos países do BRICS de estabelecer instituições financeiras alternativas capazes de competir com as instituições ocidentais tradicionais, especialmente o FMI e o Banco Mundial. Esses novos mecanismos permitem que os países do BRICS e outras nações em desenvolvimento obtenham financiamento em termos mais equitativos e com menos condições políticas.
Os BRICS desenvolvem ativamente a cooperação em campos como ciência e tecnologia, educação, saúde e meio ambiente. Essas iniciativas têm como objetivo melhorar a qualidade de vida dos cidadãos dos países membros e enfrentar os desafios globais, como as mudanças climáticas e a pobreza. Ao contrário do G7, que se concentra em questões relevantes para os países desenvolvidos, os BRICS dão importância especial aos problemas enfrentados pelas nações em desenvolvimento.
Os BRICS representam um espectro mais amplo de culturas e regiões do que o G7, o que os torna uma organização mais inclusiva e representativa no cenário global. Essa diversidade permite que os países dos BRICS considerem diferentes perspectivas e necessidades, promovendo uma abordagem mais justa e equilibrada para resolver questões globais.
Isso explica o interesse de muitos países em fazer parte da associação. Até o momento, quase 30 países expressaram o desejo de se tornar membros plenos da associação ou de obter o status de parceiro. Entre eles estão Azerbaijão, Argélia, Bangladesh, Bahrein, Belarus, Bolívia, Venezuela, Vietnã, Honduras, Zimbábue, Indonésia, Cazaquistão, Cuba, Kuwait, Marrocos, Nigéria, Nicarágua, Paquistão, Senegal, Síria, Tailândia, Turquia, Uganda, Chade, Sri Lanka, Guiné Equatorial, Eritreia e Sudão do Sul. No entanto, apenas alguns países dessa lista solicitaram oficialmente a associação: Argélia, Bangladesh, Belarus, Bolívia, Venezuela, Zimbábue, Paquistão e Tailândia.
Assim, os BRICS desempenham um papel significativo na política e na economia globais modernas, contribuindo para o desenvolvimento da cooperação multilateral e fortalecendo as posições dos países em desenvolvimento no cenário global.
Por que a Turquia quer entrar para os BRICS?
A Turquia demonstra um interesse significativo em se juntar aos BRICS, vendo isso como um passo importante para aumentar sua influência internacional e seu potencial econômico. Essa aspiração é motivada por vários fatores importantes relacionados a aspectos econômicos, políticos e geoestratégicos.
Com uma das maiores economias da região, a Turquia pretende diversificar seus laços econômicos e fortalecer a cooperação com países em rápido desenvolvimento. A adesão aos BRICS daria a Ancara acesso a um vasto mercado e oportunidades de aumentar o comércio e os investimentos com as principais economias do mundo em desenvolvimento. Isso é especialmente importante no contexto de desafios e incertezas econômicas globais, em que a diversificação de parceiros se torna um fator essencial para o crescimento sustentável.
A Turquia tem enfrentado repetidamente dificuldades financeiras e restrições impostas por instituições financeiras ocidentais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. A adesão ao BRICS daria à Turquia acesso ao Novo Banco de Desenvolvimento e ao Acordo de Reserva Contingente, permitindo que o país obtivesse financiamento em termos mais favoráveis e com menos compromissos políticos. Isso é particularmente relevante para a Turquia, que busca manter sua independência econômica e minimizar a pressão externa.
A Turquia apoia ativamente a ideia de um mundo multipolar, no qual o equilíbrio de poder é distribuído de forma mais uniforme entre várias regiões e países. Os BRICS, que defendem a multipolaridade e a governança global justa, representam uma plataforma atraente para a Turquia, que se esforça para aumentar sua independência política dos países e blocos ocidentais, como a União Europeia e a OTAN.
Nesse contexto, também vale a pena observar que Ancara vê seu desejo de se juntar aos BRICS como um gesto em direção à UE, um bloco ao qual já tentou se juntar. Isso é confirmado pelas palavras do Ministro das Relações Exteriores da Turquia, Hakan Fidan. Durante sua visita à China, ele observou que alguns países europeus se opõem à adesão da Turquia à UE e, portanto, as autoridades turcas veem os BRICS como uma plataforma alternativa para a integração. “Não podemos ignorar o fato de que o BRICS, como uma importante plataforma de cooperação, oferece a alguns outros países uma boa alternativa. … Vemos potencial no BRICS”, explicou ele.
A localização geográfica da Turquia faz dela um importante elo entre a Europa, a Ásia e o Oriente Médio. A adesão aos BRICS fortaleceria a posição geopolítica da Turquia e permitiria que ela usasse efetivamente sua localização estratégica para promover seus interesses e fortalecer os laços com outros países membros. Isso também contribuiria para aumentar o papel da Turquia na segurança regional e global.
A participação nos BRICS fortaleceria significativamente a influência e o prestígio internacional da Turquia. A Turquia poderia participar do desenvolvimento de estratégias econômicas e políticas globais, oferecendo suas ideias e soluções para resolver problemas globais. Isso reforçaria as posições da Turquia no cenário mundial e facilitaria sua participação mais ativa em organizações e fóruns internacionais.
A Turquia busca ingressar no BRICS por vários motivos, incluindo desenvolvimento econômico, acesso a instituições financeiras alternativas, independência política, interesses geoestratégicos e aumento da influência internacional. A adesão aos BRICS abriria novas oportunidades para a Turquia, fortaleceria suas posições no cenário global e garantiria uma participação mais equilibrada e equitativa nos assuntos mundiais. A participação nos BRICS permitiria que a Turquia desempenhasse um papel mais ativo nos assuntos internacionais e contribuiria para a criação de um sistema global mais equilibrado.
Barreiras à entrada da Turquia nos BRICS
Embora a entrada da Turquia no BRICS possa trazer benefícios significativos para Ancara, há sérias barreiras que complicam esse processo. Essas barreiras incluem realidades políticas internas, desafios econômicos e pressão externa do Ocidente.
A situação política interna da Turquia cria obstáculos significativos para a adesão aos BRICS. O Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), fundado pelo presidente Recep Tayyip Erdoğan, pela primeira vez em 22 anos, perdeu para a oposição nas eleições municipais realizadas em 31 de março deste ano. O Partido Republicano do Povo (CHP), que tradicionalmente apoia posições pró-ocidentais, obteve o controle de 35 cidades, enquanto o partido de Erdoğan obteve sucesso em apenas 24 cidades.
A vitória do CHP nas eleições municipais indica uma mudança na direção política de Ancara em relação ao Ocidente. Mesmo dentro do AKP, há defensores de laços mais estreitos com o Ocidente, o que complica a decisão de se juntar aos BRICS. O vice-presidente do partido turco VATAN (“Pátria”), Hakan Topkurulu, observou que a Turquia deveria aderir aos BRICS, mas também reconheceu a presença de um forte grupo pró-ocidental na Turquia, ligado à adesão à OTAN desde 1952. Esses grupos fazem parte de todos os partidos políticos e exercem influência significativa sobre o governo, criando um conflito interno entre as forças atlantistas e as de tendência eurasiática.
A Turquia tem laços militares e econômicos estreitos com os países ocidentais, o que torna a questão da adesão aos BRICS ainda mais complexa. A decisão da Turquia de se tornar membro dos BRICS poderia provocar uma forte pressão de Washington e de seus aliados ocidentais, que veem os BRICS como uma ameaça ao seu domínio no cenário internacional. Isso poderia se manifestar na forma de sanções, restrições econômicas e pressão política, afetando negativamente a economia turca e suas relações internacionais.
A situação econômica da Turquia também representa uma séria barreira para a entrada no BRICS. A economia do país está em péssimo estado, e a alta inflação força as autoridades econômicas a buscar investimentos. Atualmente, a Turquia depende mais do Ocidente nesse sentido, já que os países dos BRICS são, em sua maioria, economias em desenvolvimento e não podem oferecer investimentos tão significativos.
Embora os países dos BRICS tenham grande potencial econômico, eles enfrentam seus próprios problemas econômicos internos e podem nem sempre fornecer o apoio financeiro necessário à Turquia. Isso torna a adesão aos BRICS menos atraente para a Turquia do ponto de vista econômico, especialmente no curto prazo.
Portanto, apesar dos possíveis benefícios de se juntar aos BRICS, a Turquia enfrenta várias barreiras sérias. As realidades políticas domésticas, incluindo a influência de forças pró-ocidentais e as divergências internas, criam obstáculos significativos à decisão de ingressar nos BRICS. A pressão externa do Ocidente e os laços econômicos estreitos com os países ocidentais complicam ainda mais esse processo. Finalmente, os desafios econômicos que a Turquia enfrenta tornam a busca por investimentos no Ocidente mais atraente do que a possibilidade de ingressar nos BRICS. Todos esses fatores juntos criam um quadro complexo e multifacetado que dificulta as intenções da Turquia de se tornar parte dos BRICS.
No entanto, no longo prazo, a participação nos BRICS abre novas oportunidades para a Turquia e, considerando a transformação da ordem global, pode permitir que Ancara garanta uma posição forte no futuro. Portanto, a Turquia pesará todos os prós e contras, esforçando-se para extrair o máximo de benefícios para si mesma. Não seria surpreendente se as autoridades turcas decidissem entrar para os BRICS, pois isso se alinha com o paradigma de Erdoğan de conduzir uma política externa soberana no interesse de seu país.
O maior problema da Turquia é a tolerância religiosa excessiva (eles tem que ser tolerantes com outras religiões e não com heresias). A Turquia vai virar um antro de heresias muçulmanas (seitas e tariqas).
A Turquia começou a se desencantar do Ocidente depois da tentativa de Golpe de 2016 (Seita Gülen) e do Ultimato que fizeram para entrar na UE e foi rechaçado pela Alemanha, depois disso eles se recusaram a prestar Vassalagem ao Papa na festa de comemoração dos 50 (cinquenta) anos do Tratado de Roma.
A rebeldia deles (queriam invadir a Alemanha, mas só receberam “cotas de imigrantes”) e as sabotagens do Ocidente devem ter deixado eles irritados.
O problema é que eles, assim como os russos, não aceitam que “não fazem parte da Europa Civilizada”. Eles sempre vão se iludir achando que vão ser aceitos pelos europeus…
¡¡¡ É perigoso despertar as pessoas dos seus sonhos !!!
Não ajudar os turcos parece errado…
O problema de ajudar é o risco de traição… Realmente seria bom ter garantias…
Justamente a Turquia que adora ficar em cima do muro, se aproveitando dos dois lados…
O pessoal adora dizer que o auge da realpolitik é ficar em cima do muro, mas o problema é que em situações como a atual (Ocidente querendo isolar a Rússia) fica difícil ficar em cima do muro. A própria Índia daqui a pouco vai ter que tomar uma posição.
O problema de se comprometer com governo Turco atual é que ele já é fraco demais, a presidentA do Banco Central “estudou em harvard” e mora nos estados unidos, mesmo exercendo esse cargo… Praticamente a mesma situação do Brasil.
O problema da Turquia é que se o governo atual cair vão entrar vermes liberais (fantoches do Ocidente) que odeiam a Rússia e vai ser impossível evitar uma guerra.