
Do Movimento de Solidariedade Íbero-americana.
A ostensiva rebelião do eleitorado europeu contra as suas elites políticas, principalmente, na Alemanha e na França, que reforçou consideravelmente a bancada conservadora no Parlamento Europeu, foi em grande medida alimentada pelos ruidosos protestos dos produtores agropecuários do continente, desde o ano passado rebelados contra os excessos da agenda ambientalista/climática da União Europeia (UE).
Para tentar abafar os rebeldes, os “eurocratas” de Bruxelas comandados pela comissária Ursula von der Leyen concordaram em suspender a aplicação de várias medidas do Pacto Verde (Green New Deal), entre elas, a necessidade de preservação da vegetação original em 4% das propriedades rurais para a proteção da biodiversidade. É isso mesmo, quatro por cento; no Brasil, sempre apontado como “vilão ambiental” internacional, o menor índice de preservação vegetal imposto pelo Código Florestal é de 20%, nas propriedades situadas no bioma Mata Atlântica (no bioma Amazônia é de 80%).
Mas o momento não é para ficar apontando o dedo e trocando acusações com os produtores europeus, e sim de unir esforços em defesa da segurança alimentícia global. Esta sim, grandemente ameaçada pelo efeito combinado da agenda malthusiana do ambientalismo politicamente instrumentalizado e da atuação dos grandes cartéis transnacionais de alimentos, fortes apoiadores da primeira, em especial, nos países em desenvolvimento exportadores de alimentos.
E não poucos representantes dos setores produtivos desses países, brasileiros inclusive, se deixam levar pela questionável possibilidade de seus países poderem “contornar” o protecionismo cada vez mais acentuado da UE e dos EUA, oferecendo-se como “soluções” putativas para a suposta crise climática global.
Um deles é o ex-diplomata e ex-presidente da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevedo, que disse em entrevista ao “Estadão” de 26 de junho: “Há uma modernização extraordinária em curso no agronegócio brasileiro, que não só está sendo mais produtivo, mas está sendo mais produtivo com menor pegada de carbono. Pouco disso, no entanto, será reconhecido se nós esperarmos que esse reconhecimento venha de graça. Ele não virá de graça. Por isso, precisamos usar os momentos que nós temos pela frente para justamente apresentar essa face do agronegócio brasileiro como potencial solução para o problema climático e não como um problema em si.”
Ou seja, os europeus podem deixar de lado a agenda climática (por lá, poucos creem que a suspensão do Pacto Verde será apenas temporária), mas os brasileiros podem continuar seguindo essa pauta disfuncional, bancando os bons moços e, claro, tratando de aproveitar para fazer negócios. Não por acaso, Azevedo, que é lobista da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), é também sócio da gestora de investimentos verdes YvY, junto com o ex-ministro da Economia Paulo Guedes e o ex-presidente do BNDES Gustavo Montezano.