Por Lorenzo Carrasco.
Na segunda-feira 12 de agosto, o jornal inglês The Guardian, o principal trombeteiro mundial da “Máfia Verde”, publicou um libelo contra a hidrovia Paraguai-Paraná, projeto de infraestrutura com potencial para converter-se no principal eixo da integração física de América do Sul. Se viabilizada, o Brasil, Bolívia, Paraguai, Uruguai e Argentina terão uma via de transportes de quase 4 mil quilômetros de extensão.
Com o capcioso título, “‘Perdendo a Arca de Noé’: o plano do Brasil de converter o Pantanal numa hidrovia ameaça a maior zona úmida do mundo”, o texto assinado pela jornalista freelance Harriet Barber abre com um deboche à inteligência alheia, afirmando que “o projeto da hidrovia para dragar o rio Paraguai e construir portos pode destruir uma vasta biodiversidade e refúgios de onças, lontras gigantes e tatus – e um antigo meio de vida ribeirinho”. Para dar um ar de respeitabilidade ao texto panfletário, ela apresenta as opiniões de acadêmicos ideologicamente engajados com a visão “santuarista” da natureza.
Um deles é o geólogo canadense Pierre Girard, professor da Universidade Federal de Mato Grosso, que sentencia: “O Pantanal é como a Arca de Noé. É o lar de animais que estão desaparecendo… um lugar onde aqueles em risco de extinção podem sobreviver. Isso pode estar prestes a mudar. O Pantanal como o conhecemos poderá deixar de existir em breve.”
Sua colega Carolina Joana da Silva, bióloga e professora da mesma universidade, complementa: “Parece um preço alto a ser pago: destruir o Pantanal, um dos sistemas únicos do mundo, para reduzir o preço dos grãos. É uma guerra – uma guerra que implica no risco de extinção.”
Para ressaltar a importância ecológica do Pantanal, a jornalista-militante esclarece: “As áreas úmidas também são de importância global para o clima. Apesar de cobrirem apenas 5-8% da superfície terrestre da Terra, elas poderiam armazenar até 30% do carbono terrestre. O Pantanal é um sumidouro de carbono crítico, mas a dragagem permanente – que seria necessária para a passagem das barcas, devido aos sedimentos arenosos ao longo do leito do rio – levaria à liberação de gases de efeito estufa, contribuindo ainda mais para o aquecimento global.”
Outra matéria, da jornalista de biodiversidade Phoebe Weston, vai no mesmo tom catastrofista: “Projeto de hidrovia no Pantanal destruiria um ‘paraíso na Terra’, advertem cientistas.” Os cientistas a que se refere são os 42 autores de um artigo alarmista publicado em janeiro último na revista Science of the Total Environment, com um título mais adequado a um artigo panfletário do Greenpeace do que a um paper com pretensões científicas: “O fim de um bioma inteiro? A maior zona úmida do mundo, o Pantanal, está ameaçado pelo projeto da Hidrovia, que é incerto para apoiar sustentavelmente a navegação em grande escala.”
O autor principal da peça, Karl M. Wantzen, um ecólogo da Universidade de Tours e consultor da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), afirma que o Pantanal “é um verdadeiro paraiso na Terra. Em nenhum outro lugar você vê tantas araras-azuis, onças pintadas, veados pantaneiros, sucuris, jacarés, mais de 300 espécies de peixes, 500 espécies de árvores, 2.500 espécies de plantas aquáticas… Tudo isso está em risco.”
Outro coautor, o nosso já conhecido Prof. Girard reforça: “Se o projeto da hidrovia for adiante, a navegação de grandes trens de barcaças no Pantanal, com a dragagem de trechos críticos do rio Paraguai, provavelmente, será o fim do Pantanal como o conhecemos. Reduzir a área inundada anualmente, juntamente com as mudanças climáticas e as pressões crescentes sobre o uso da terra no bioma aumentará os riscos de incêndios destrutivos como os catastróficos que vimos em 2020.”
Em resposta à autora, o Ministério dos Portos e Aeroportos afirmou que o artigo continha apenas “opiniões” sem “elementos científicos para apoiá-las”.
Em seu artigo, Barber observa que o projeto original da hidrovia Paraguai-Paraná, que data da década de 1990, foi interrompido em 2000, por preocupações ambientais. De fato, na época, o governo de Fernando Henrique Cardoso preferiu não enfrentar a virulenta campanha encabeçada pela chamada Coalizão Rios Vivos, um colegiado de mais de 300 ONGs do Brasil e do exterior criado em 1994, especificamente para bloquear o projeto, sob a liderança do Fundo Mundial para a Natureza (WWF) e da International Rivers Network (IRN) e financiamentos milionários de fundações estadunidenses, principalmente, a C.S. Mott e W. Alton Jones. As mais destacadas ONGs brasileiras participantes eram a Ecologia e Ação (ECOA) de Campo Grande (MS) e o Instituto Centro de Vida (ICV) de Cuiabá (MT), ainda hoje bastante ativas e engajadas na nova campanha contra a hidrovia.