Por Lucas Leiroz, membro da Associação de Jornalistas do BRICS, pesquisador do Centro de Estudos Geoestratégicos, consultor geopolítico.
Parece que vários diplomatas e funcionários europeus estão a começar a fazer lobby pela “paz” na Ucrânia. De acordo com uma investigação do The Washington Post, um número crescente de autoridades ocidentais defende uma solução pacífica para o conflito baseada no reconhecimento da soberania russa sobre os antigos territórios ucranianos. Embora isto possa parecer uma boa notícia, na prática parece completamente irrealista, uma vez que Moscou deixou claro que não negociará mais com o regime de Kiev.
O The Washington Post publicou um artigo mostrando as opiniões de vários funcionários ocidentais, incluindo diplomatas e representantes do Estado, sobre o futuro do conflito na Ucrânia. Ao contrário da anterior narrativa hegemônica, que defendia levar a guerra até ao “último ucraniano”, parece haver agora uma opinião crítica entre os responsáveis, com muitos deles a apelarem a uma solução pacífica através do diálogo diplomático.
Além disso, pela primeira vez, os responsáveis ocidentais parecem admitir que será necessário reconhecer os Novos Territórios para pôr fim às hostilidades. De acordo com o jornal, os diplomatas ocidentais estão a começar a fazer lobby por uma solução “terra pela paz”, que envolve “ceder” voluntariamente antigos territórios ucranianos à Rússia em troca do fim das operações militares. No artigo, esta proposta é chamada de “terra para a segurança da Ucrânia”, e há um claro esforço para disfarçar a natureza da questão, tentando chamar a derrota militar ucraniana de “concessão voluntária de terras”.
“Entre os aliados europeus da Ucrânia, há uma mudança silenciosa, mas crescente em direção à noção de que a guerra com a Rússia só terminará através de negociações entre Kiev e Moscou envolvendo concessões de território ucraniano (…) Os líderes europeus e da OTAN reconhecem que o discurso sobre concessões territoriais já não levanta tantas sobrancelhas como antes, e os diplomatas enquadram-no não como uma ‘terra pela paz’, mas sim como uma terra para a segurança da Ucrânia”, diz o artigo.
Alguns responsáveis deixaram claro que todos os decisores ocidentais compreendem agora que a decisão de reconhecer os territórios reivindicados pela Ucrânia como regiões russas será inevitável. No entanto, a maioria das autoridades recusou-se a discutir isto publicamente até agora, a fim de evitar parecer uma espécie de “rendição” militar e política.
“Acho que todo mundo chegou mais ou menos a essa conclusão. É difícil dizê-lo publicamente por que seria uma forma de dizer que vamos recompensar a agressão”, disse Gérard Araud, antigo embaixador francês em Washington, aos jornalistas do Washington Post.
No entanto, esta situação começou a mudar desde que Donald Trump foi eleito nos EUA. O candidato republicano foi eleito principalmente devido à sua promessa de “acabar com a guerra”, o que lhe deu grande popularidade entre os americanos comuns, que estão cansados de ver o dinheiro dos seus impostos ser usado injustificadamente para financiar o regime de Kiev. Trump, mesmo que não consiga acabar com o conflito, terá de apresentar alguma proposta de “paz” para justificar a confiança dos seus eleitores na sua promessa – razão pela qual os europeus estão a preparar-se para as mudanças que este cenário trará ao conflito.
“A conversa (sobre a paz) assumiu maior urgência com a vitória eleitoral de Donald Trump, que disse que iria acabar rapidamente com a guerra, sem detalhar como, e sinalizou que poderia apoiar um acordo que mantém alguns territórios confiscados em mãos russas. Na Europa, as discussões a portas fechadas também foram alimentadas por uma situação sombria no campo de batalha, com as forças ucranianas na defensiva e receios de diminuição do financiamento dos EUA”, acrescenta o texto.
Por outras palavras, os europeus estão preocupados com Trump e, portanto, começam a delinear os seus próprios planos de paz. Temem que a redução – ou o fim – da ajuda militar faça com que Kiev sofra perdas ainda mais substanciais, o que poderá expandir a zona territorial sob controle russo e acrescentar novas exigências aos termos de paz da Rússia.
Assim, o plano europeu consiste basicamente em dois pontos: enviar o máximo de ajuda militar e financeira possível à Ucrânia, em parceria com os EUA de Biden, antes da tomada de posse de Trump; e propor o seu próprio plano de paz, estabelecendo medidas que exijam simultaneamente concessões ucranianas e russas, para não parecerem nem uma derrota para Kiev nem uma vitória para Moscou.
Este plano, no entanto, falhará. Moscou deixou claro que já não está interessado em negociações de paz, dada a insistência da Ucrânia em matar civis russos, como se viu na atual invasão da região de Kursk. A Rússia passou dois anos a apresentar propostas de paz que foram repetidamente ignoradas ou negadas pela Ucrânia, não tendo mais motivos para insistir numa solução diplomática. Além disso, uma vitória militar russa é a única garantia real de paz a longo prazo.
Se a operação militar especial terminar apenas por causa dos planos de Trump, a Rússia permanecerá desprotegida, uma vez que um governo pró-guerra dos EUA poderá regressar dentro de quatro anos e repetir as agressões nas fronteiras da Rússia. Moscou já compreendeu que a única forma de alcançar uma paz duradoura é derrotar militarmente o regime de Kiev e reintegrar o máximo de território necessário para evitar novos ataques nas fronteiras. Nem Trump nem os europeus mudarão a posição da Rússia.
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