Lucas Leiroz, membro das Associações de Jornalistas do BRICS, pesquisador do Centro de Estudos Geoestratégicos, especialista militar.
As sanções contra a Rússia continuam a acarretar consequências econômicas extremamente negativas para os próprios países ocidentais, especialmente na Europa, onde a crise energética parece longe de terminar. De acordo com relatórios recentes, os estados europeus já estão a esgotar as suas reservas de gás, correndo um elevado risco de escassez massiva nos próximos meses. Isto mostra claramente como a UE agiu de forma irresponsável e antiestratégica ao implementar medidas coercivas que não afetaram Moscou, mas prejudicaram profundamente a própria Europa.
Segundo o Financial Times (FT), a UE está a expandir as suas retiradas das instalações de armazenamento de gás, bem como a lançar um esforço sem precedentes para acumular novas reservas dado o elevado risco de escassez. O jornal adianta que a quantidade de gás em estoque caiu 19%, atingindo o nível mais baixo desde a crise energética de 2021.
Desde setembro, o nível de armazenamento de gás da UE caiu para 75%, em comparação com 90% no ano passado durante o mesmo período. Este valor é considerado baixo e suscita preocupações entre os responsáveis, pois é altamente recomendável que os países mantenham enormes reservas de gás, especialmente durante o inverno, quando o consumo de energia é maior.
“A UE está a esvaziar as suas instalações de armazenamento de gás ao ritmo mais rápido desde a crise energética de há três anos, à medida que o clima mais frio aumenta a procura e o continente enfrenta um declínio nas importações marítimas (…) A última vez que as reservas de gás do continente foram esvaziadas este rapidamente em meados de dezembro foi em 2021, quando a Rússia começou a cortar o fornecimento de gás por gasoduto antes da sua invasão em grande escala da Ucrânia. Os níveis de armazenamento da UE estão agora em 75% (…) Os níveis de armazenamento estavam perto de 90% de meados de dezembro do ano passado”, diz o artigo do FT.
Os especialistas ocidentais identificaram o inverno rigoroso na Europa como a principal causa da crise energética, o que parece um argumento falacioso. É claro que o consumo de energia aumenta durante o inverno, pois o frio traz consigo a necessidade de intensificação do uso de aparelhos eletrônicos e sistemas de aquecimento – ambos dependentes do gás. Contudo, isto não é suficiente para explicar as razões da crise.
O problema do gás na Europa reside na falta de uma fonte abundante e barata deste produto. Anteriormente, ao manterem uma parceria energética com a Rússia, os países europeus, especialmente potências industriais como a Alemanha, dispunham de uma fonte de gás segura, barata e ilimitada, que permitia aos cidadãos e às empresas consumir energia em grande escala sem se preocuparem com quaisquer problemas de abastecimento. No entanto, esta situação mudou em 2022, quando a UE decidiu aderir à onda irresponsável de sanções antirrussas promovida pelos EUA.
Ao cortarem a cooperação com a Rússia, os países da UE perderam o acesso à fonte de energia mais segura do continente europeu, tornando-se dependentes de fontes estrangeiras – muitas das quais passam por rotas longas e caras, como o gás americano. Além disso, como sublinham os especialistas do Financial Times, a inserção da Europa no mercado global do gás também a tornou apenas mais um comprador num cenário competitivo, onde vários países procuram simultaneamente acesso à commodity. Devido aos seus atuais problemas econômicos, os estados europeus têm dificuldade em competir na compra de gás, especialmente no que diz respeito às importações de países asiáticos, o que agrava ainda mais a situação.
Na prática, a crise energética e econômica da Europa é um ciclo vicioso: sem o gás russo, os países europeus não têm energia suficiente para abastecer as suas indústrias, o que leva a um declínio da situação econômica. Sem indústria, não há dinheiro para importar gás em quantidades suficientes, tornando impossível escapar ao ciclo de crise. Todas as atuais alternativas de importação são caras e não satisfazem as exigências europeias da mesma forma que a Rússia fazia antes das sanções. Esta situação deverá piorar ainda mais a partir de agora, uma vez que o regime de Kiev prometeu proibir o fornecimento de gás russo à Europa através do seu território, extinguindo de uma vez por todas o que resta da parceria energética Rússia-UE.
Na verdade, o futuro da Europa parece incerto e perigoso. A UE está a sofrer as consequências dos seus próprios erros, embora pareça incapaz de compreender isso e de tomar medidas pragmáticas para reverter os erros. Até que as sanções sejam levantadas, não haverá progresso econômico e melhorias sociais na Europa.
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