
Em entrevista ao jornalista Reinaldo Azevedo, o ministro do STF Gilmar Mendes defendeu o chamado “regime semipresidencialista”, no qual o poder executivo ficaria dividido entre o presidente da República e um primeiro-ministro, ficando este responsável pela condução do governo.
Esta mudança é tema de uma PEC (proposta de emenda à constituição), protocolada pelo deputado Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR), na Câmara dos Deputados, a PEC 02/25, que além do “semipresidencialismo”, institui o voto distrital misto. Nesta proposta do deputado Hauly, o semipresidencialismo seria adotado em 2030, enquanto que o voto distrital misto valeria para as eleições de 2026, caso a proposta seja aprovada pelo Congresso Nacional ainda este ano.
Há alguns fatores que favorecem o andamento da proposta:
1. O apoio do novo presidente da Câmara, Hugo Mota, ao projeto, apesar dele manifestar que o projeto “não tem urgência”.
2. O apoio expresso do ministro Gilmar Mendes, conforme pode ser visto na entrevista, em que após discorrerem uma hora sobre os perigos do golpe que teria dado errado no 08/01/2023, ms rigorosamente punido pelo STF, o jornalista Reinaldo Azevedo sugere que se o “semipresidencialismo”, ou, na verdade, o parlamentarismo já estivesse em vigor, Bolsonaro jamais teria chefiado o governo ou Gustavo Lima, o cantor do pop sertanejo, jamais seria primeiro-ministro. Ao passo que Gilmar Mendes responde que a proposta de novo regime apenas oficializaria o que já ocorre na prática, em que o Congresso já controla metade do orçamento não vinculado da União, sob a forma de emendas.
Não cabe esquecer que Reinaldo Azevedo e Gilmar Mendes representam o “PSDB autêntico”, tal como existia na época do Governo Fernando Henrique (1995-2002). Gilmar Mendes entrou no STF após ser indicado por FHC, após atuar como Advogado Geral da União. Já Reinaldo Azevedo era uma das grandes vozes do tucanato na imprensa, hostil ao PT até o avanço da Operação Lava Jato sobre as lideranças do país na época de crise do governo Dilma 2 (2015-16). O PSDB, desde a sua origem no final dos anos 1980, tinha no parlamentarismo uma de suas bandeiras.
3. A queda de popularidade de Lula, que explodiu desde dezembro do ano passado, que vai dificultar ainda mais sua relação com o Congresso. Caso mantenha-se a tendência de queda de popularidade, medidas como impeachment (já efetuadas duas vezes desde 1988) ou mudança de regime tornam-se politicamente mais palatáveis – quem sabe antecipando a entrada do “semipresidencialismo” para o ano que vem, sem esperar as eleições.
4. Há também o fator Bolsonaro. Matéria da Folha de S. Paulo indica que o procurador geral Paulo Gonet deve apresentar denúncia contra o ex-presidente antes do Carnaval, elencando uma série de acusações que poderiam resultar em mais de 20 anos de pena. Mas se houver apoio no STF ao “semipresidencialismo”, nada indica que seja pedido à bancada bolsonarista apoio à proposta em troca de uma anistia a Jair Bolsonaro, permitindo-lhe até recuperar os direitos políticos e voltar a presidência – mesmo que como uma “Rainha da Inglaterra”, com menos poderes que tinha Elizabeth II no trono britânico.
De qualquer forma, o jurista Rodrigo Pedroso aponta a “PEC do semipresidencialismo” poderia ser considerada inconstitucional, pois iria contra o parágrafo 4o. do art. 60 da Constituição de 1988, que estipula que “não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a separação de poderes”, pois em um sistema parlamentarista as funções do Legislativo e Executivo se aproximariam em muito, pois o primeiro-ministro governaria com o Congresso.

Segundo Pedroso, esse entendimento foi reconhecido pelo ex-presidente Michel Temer, ainda nos tempos da Assembleia Constituinte, em artigo de 1987, em que ele reconhece a incompatibilidade entre o parlamentarismo e o princípio da separação de poderes, que a Constituição de 1988 tornou cláusula pétrea, após a vitória do presidencialismo no Plebiscito de 1993.
