
Marcelo Ramírez
Em 14 de fevereiro de 2025, o mundo financeiro foi abalado por um escândalo que ultrapassou fronteiras. Não se trata de um problema exclusivo da Argentina: os investidores que foram prejudicados são de diferentes setores e países. De fato, alguns estão indignados com Javier Milei.
O que aconteceu exatamente? O presidente da Argentina promoveu um token chamado “$Libra” em suas mídias sociais, descrevendo-o como uma iniciativa privada para financiar pequenas empresas e empreendimentos locais. Algo altamente incomum: um chefe de Estado não deveria estar envolvido em um ativo financeiro especulativo. Isso é ainda mais surpreendente se estivermos falando de um presidente que defende a interferência mínima do Estado na economia.
O problema é que essa criptomoeda acabou se tornando uma fraude. Era uma memecoin sem respaldo na economia real, com volatilidade muito alta e, o mais grave, 80% dos tokens concentrados em cinco carteiras, o que sugere manipulação do mercado. E a Milei a promoveu.
A origem desse desastre remonta a outubro de 2024, quando um empresário chamado Julian Peh obteve acesso ao presidente. Peh, um cidadão de Cingapura com sobrenome chinês, é proprietário da “K Protocol”, a empresa que criou a Libra. Nem todo mundo consegue uma audiência com um chefe de Estado. Quem abriu as portas para ele? Manuel Adorni, porta-voz da presidência, com o apoio de Karina Milei.

O primeiro encontro entre Milei e Peh foi em 19 de outubro, no Hotel Libertador, de propriedade de Eduardo Elsztain, onde Milei se refugiou após vencer as eleições. Uma reunião em um evento fechado, sem a presença da imprensa, organizada por Peh sob o nome “Tech Forum”, um rótulo criado apenas dois meses antes.
A criptomoeda foi lançada e os investidores apostaram seu dinheiro confiando no endosso presidencial. Horas depois, o preço despencou de US$ 970 para menos de um dólar. Estima-se que 44 mil investidores perderam entre US$ 87 milhões e US$ 500 milhões.

Quando o escândalo se tornou incontrolável, Milei excluiu seu tweet e afirmou que não tinha “nenhuma conexão” com o projeto. No entanto, o endosso presidencial já havia causado danos.
O que é pior, incompetência ou cumplicidade? Em ambos os casos, ele não está apto a permanecer no poder. O presidente tem responsabilidade direta. Ele não é uma pessoa comum, mas a principal autoridade do país. Sua decisão de promover um ativo especulativo sem investigar sua legitimidade é, no mínimo, negligente. E se ele sabia o que estava fazendo, pior ainda.
O código de ética do serviço público proíbe que os funcionários públicos apoiem empresas privadas. Milei violou esse princípio, afetando a credibilidade do mercado argentino. Além disso, ele pode ter incorrido em infrações criminais, como violação do dever como funcionário público ou fraude.
Enquanto isso, a oposição reage de forma tímida. Nenhum partido tomou medidas decisivas além de alguns tweets e pedidos de investigação. Tampouco o sistema judiciário argentino parece ter a intenção de agir rapidamente.
O impacto internacional é significativo. A mídia de todo o mundo cobriu a história, desde a Bloomberg até o Financial Times. E isso acontece pouco antes da viagem de Milei a Washington para solicitar financiamento do FMI. Sua credibilidade foi destruída.
O escândalo deixa muitas perguntas em aberto: Milei é um vigarista ou um homem ingênuo que foi enganado? Se ele foi vítima de uma operação política, quais atores estavam por trás dela? Se não, como explicar sua falta de jeito ao cair em tal manobra? Seja qual for a resposta, a conclusão é a mesma: Milei provou ser um perigo para a estabilidade do país.
Mas a pergunta mais importante é: e agora? A falta de reação política e judicial demonstra a extensão da corrupção e da impunidade na Argentina. Se esse golpe não for suficiente para questionar seriamente sua continuidade, o que será? Talvez a única certeza nesse cenário seja que o experimento de Milei está vacilando e, quando cair, não haverá muito espaço para surpresas. Seu governo, baseado em exibicionismo e improvisação, entrou em uma espiral descendente. O problema é que, quando ele cair, o dano à Argentina já estará feito.
Imagem de capa: KontraInfo.