
Lorenzo Carrasco
O corpo editorial do “Estadão” nunca se recuperou da perda de Oliveiros Ferreira (foto, 1929-2017), um conservador não reacionário e não retrógrado que tinha uma ampla visão dos acontecimentos estratégicos globais. Desde a sua morte, em 2017, a linha editorial do sesquicentenário jornalão da família Mesquita para os grandes temas internacionais tem se limitado a reproduzir os mantras divulgados na imprensa estadunidense e europeia. Por isso, está tão perdido como as suas inspiradoras com os movimentos de Donald Trump na Casa Branca, principalmente, após a sua conversa com o russo Vladimir Putin, apresentada como uma “traição ao Ocidente”.
O editorial do sábado 8 (“A Europa em busca do tempo perdido”) é uma evidência dessa desorientação. Nele, afirma que a Europa “acordou e busca sua independência estratégica” dos EUA. Mas, claro, isto implicará em “sacrifícios inevitáveis”.
E que sacrifícios são esses? Os dois últimos parágrafos dão uma boa ideia:
“Especialistas ouvidos pela revista ‘The Economist’ estimam que para se defender sem os EUA, a Europa, que atualmente gasta por ano 1,8% do PIB com defesa, precisaria gastar no curto prazo 3,5%, e no médio prazo entre 4% e 5%. Isso sem contar o apoio à Ucrânia, que, para suprir a ausência dos EUA, precisaria subir dos atuais 0,2% do PIB para 0,4%.
“Os impostos já são altos. O relaxamento fiscal é plenamente justificável pela emergência. Mas muitos países já estão bastante endividados e há limites para a confiança dos credores. A verdade é que os europeus precisarão cortar na carne. Seu Estado de bem-estar social é o mais generoso do mundo, mas ele foi construído num momento em que a Europa tinha uma população jovem, não competia com gigantes como a China e a Índia e estava segura sob as armas dos EUA. Esse dividendo da paz se foi. Os gastos sociais precisariam ser revistos nem que fosse por uma razão de produtividade e eficiência; agora, precisarão ser cortados por uma questão de sobrevivência.”
Corte de gastos sociais, claro! Alguém pensou que seria diferente? Globalismo na veia. Nem uma palavra sobre o uso da diplomacia em vez do belicismo. Ou sobre a hegemonia da alta finança nas políticas econômicas. Depois, estranham o sucesso dos partidos nacionalistas “de direita” nos últimos anos, ou criticam governos que colocam os interesses dos seus povos acima dos caprichos dos “eurocratas” de Bruxelas, como os da Hungria e da Eslováquia.
Definitivamente, um arejamento não faria nada mal ao jornalão dos Mesquitas, pois parece que William Waack não aprendeu muita coisa com o seu antigo padrasto.