
O governo e a Eletrobras chegaram em um acordo a respeito da participação da União no controle da empresa: ganhou direito a indicar mais dois membros dos dez que compõem o Conselho de Administração da antiga estatal. Assim, o número de assentos passou de um para três.
Dessa forma, o governo indicou Silas Rondeau, Maurício Tomalsquin e Nelson Hubner para o Conselho de Administração, além do ex-ministro Guido Mantega para o Conselho Fiscal.
Em agosto de 2023, a Advocacia Geral da União entrou com uma ação de inconstitucionalidade da privatização da Eletrobras, concluída em 2022, em que a União, apesar de manter ainda 42% das ações, perdeu o controle da empresa para os acionistas minoritários, respondendo só com 10% do capital nos conselhos de Administração e dos Acionistas.
Em dezembro daquele ano, o ministro Kassio Nunes do STF encaminhou o caso para uma câmara de mediação e arbitragem. Seria um meio não para “desfazer a privatização”, conforme afirmou na época, mas para “melhor representar os interesses da União de acordo com o capital que ela possui na Eletrobras”.
O governo, por meio da AGU, acatou a decisão e seguiu negociando com a presidência da Eletrobras, até o acordo desta semana em que renuncia retomar a proporcionalidade entre o capital que possui e o peso no Conselho dos Acionistas, onde nenhum acionista, pelas regras da lei de privatização da Eletrobras, pode responder por mais de 10% dos votos, mesmo que tenha um percentual maior do que esse do capital. Uma lei que beneficia os acionistas minoritários, muitas vezes especuladores da bolsa, em detrimento dos acionistas majoritários – no caso, a União, colocando ágio (as chamadas poison pills) em caso de recompra das ações pela União, para retomar a maioria do capital.
Mesmo com o governo Lula acionando o STF em 2023, é preciso ressaltar que, durante o processo de privatização no governo Bolsonaro, nem o STF, nem outros órgãos de controle administrativo, como o Tribunal de Contas da União (TCU) ou a CGU, jamais colocaram maiores óbices ao processo de privatização da Eletrobras, mesmo com todas as “jabuticabas” inseridas na legislação, como a perda de controle sobre a empresa, em políticas de investimento e destinação de lucros e dividendos, que se materializam em perdas para o patrimônio público de uma empresa criada pelo governo na década de 1960 e da qual ainda possui considerável capital.
Conforme afirma Gilberto Bercovici, desde 1992 foram ajuizadas várias ações no STF e nenhuma jamais foi acatada, de modo que a decisão do ministro Kassio Nunes, indicado à Corte por Bolsonaro, não segue mais do que uma linha definida pelo próprio STF sobre privatizações, mesmo quando implicam empresas concessionárias de serviços públicos, dos quais o Estado brasileiro é o titular.
Nesses tempos em que o governo e boa parte dos “setores progressistas” saúdam o STF, principalmente o ministro Alexandre de Moraes, pela condução do processo contra Bolsonaro, seu círculo de poder e dos presos do 08 de janeiro, como avanço da “civilização contra barbárie golpista”, apesar dos parcos indícios materiais do golpe de Estado que estaria para ser dado entre novembro de 2022 e janeiro de 2023, a “civilização” que eles defendem põem os interesses do “mercado”, i.e. os especuladores e fundos de investimento que ganham em cima do desmonte do patrimônio público do Estado brasileiro, acumulado durante décadas, com bilionários investimentos públicos, sobre o interesse público.
Ainda mais porque o acordo fechado entre o governo e Eletrobras não definiu ainda a obrigação de investimento da Eletrobras na Eletronuclear, ainda sob controle estatal, para finalização das obras de Angra 3, que se arrastam a décadas, suspendidas em 2015, durante o alvo da Operação Lava Jato.
Já a Associação Nacional dos Empregados da Eletrobras declarou que acordo com a empresa significa uma “traição nacional”, ao aceitar os cargos nos conselhos ao invés da retomada do controle no Conselho de Administração, que seriam apenas decorativos, sem influência real nos rumos da empresa, ainda que muito bem remunerados.