
Lorenzo Carrasco
O “intelectual orgânico” vitalício do PT, José Dirceu, está de volta ao noticiário, desta vez, com uma carta aberta ostensivamente dirigida à militância petista, mas, a rigor, aos brasileiros em geral, que procuram acompanhar as disputas políticas no país.
O parágrafo mais destacado da carta é uma forte crítica à hegemonia do sistema financeiro na formulação das políticas públicas:
“É preciso uma verdadeira mudança na vergonhosa concentração de renda e no cartel bancário financeiro, na política de juros e nas metas da inflação, que exigem uma radical reforma tributária e financeira, capaz de pôr fim à apropriação e expropriação da renda nacional pelo capital financeiro e agrário, num circuito entre o Banco Central e a Faria Lima, que cada vez mais concentra renda, via os juros altos únicos no mundo. O serviço da dívida pública e praticamente a isenção histórica que gozam nossas elites da obrigação de pagar impostos limitam nossa capacidade de investimento, impedem que o Estado financie o gasto social, com o agravante de que a saída de uma elite que representa 1% da população é exatamente a manutenção do status quo e o fim do Estado de Bem-Estar Social, com o desmonte dos bancos públicos, das estatais e da nossa capacidade de planejar e financiar o desenvolvimento nacional.”
A análise e a retórica são impecáveis. Mas a prática do partido tem sido bem diversa, começando pelo primeiro mandato do presidente Lula, no qual Dirceu foi o grande condestável até ser derrubado pelo escândalo do mensalão. Neste período, além de inspirador da célebre “Carta ao Povo Brasileiro”, um virtual manifesto de bom comportamento do então candidato presidencial, ele foi peça-chave da aproximação do partido com a Faria Lima, inclusive, bancando a escolha de Henrique Meirelles para a presidência do Banco Central, com o intuito de preservar as políticas monetárias restritivas introduzidas por Fernando Henrique Cardoso, o famigerado “tripé macroeconômico” de metas de inflação, câmbio flutuante e austeridade fiscal. Mesmo depois de deixar o governo, Dirceu continuou sendo um fiador de tal política.
E recorde-se que Lula reforçou o papel do BC, equiparando o cargo de seu presidente ao de ministro de Estado, para evitar eventuais pendências judiciais contra ele.
Em essência, a investida de Dirceu contra a Faria Lima não passa de um disfarce para mascarar a submissão do partido ao rentismo junto à sua militância e aos minguantes apoiadores que ainda se deixam enganar pelo seu discurso dito “progressista”.