
Em evento do site Monitor do Mercado, ocorrido em São Paulo, no dia 02 de junho, o economista e ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega apontou que o Brasil corre sério risco de enfrentar um “apagão orçamentário” não mais tardando que em 2027.
Pelas regras fiscais adotadas desde 2017, com o regime de Teto de Gastos, modificado depois para o Arcabouço Fiscal, em 2023, o governo se impôs limitações para seus gastos, excluindo os da dívida pública. No entanto, a União tem cada vez mais despesas fixas, como a previdência e pessoal, além dos gastos mínimos constitucionais em saúde e educação.
Os gastos com a previdência já alcançam pouco mais da metade das despesas primárias (excluídas as despesas com juros da dívida) e se somar os gastos com saúde, educação e programas sociais (incluindo o Bolsa Família), os gastos chegam a 94% do orçamento, segundo Maílson. As despesas com precatórios, que ainda não entram nesse montante, passarão a compô-las, de acordo com as regras do Arcabouço. Assim, dentro de poucos anos, não haverá mais espaço orçamentário para investimentos em infraestrutura e ciência e tecnologia.
Maílson da Nóbrega foi ministro da Fazenda do governo Sarney (1985-1990), justamente na época da promulgação da Constituição de 1988, da qual é crítico severo. A Constituição impôs uma série de gastos obrigatórios e corrigidos, com um sistema de saúde pública e universal e previdência que, em tese, deveriam funcionar como o dos países europeus. Para isso seria necessário um ritmo de crescimento da economia constante para dar esteio a esses serviços públicos, sem asfixiar a tributação em cima dos cidadãos.
Por outro lado, não se previu, durante a constituinte, que a dívida pública seria tão custosa por tanto tempo, até mesmo porque a questão principal naquela época era a dívida externa, negociada com os credores internacionais, e não a dívida interna, controlada pelo Banco Central. No entanto, desde então criou-se uma febre por títulos públicos com valorização acima da inflação, fenômeno que se mantém até hoje com a taxa SELIC acima dos 14% ao ano.
Diante deste quadro, os governos se veem obrigados a contingenciar suas despesas, comprometendo órgãos e serviços públicos. Um caso notório é das universidades e institutos públicos, frequentemente sujeitos a contenção de despesas que comprometem seu funcionamento, sem verba para custeio e manutenção de suas instalações, assim como para pagamento de pessoal terceirizado que presta serviço de limpeza, segurança etc.
Mas a última foi a contenção anunciada no Ministério da Defesa que deve afetar profundamente as Forças Armadas, na casa dos R$ 2,6 bilhões. Fontes dos militares anunciam que pode faltar recursos para combustíveis de aeronaves e blindados e até para compra de munição.
Claro que o governo pode modificar ou deixar de seguir as regras fiscais, mas, no momento, se vê sem força política para negociar essa postura com o Congresso. Do mesmo modo, mostra-se incapaz de seguir uma diretriz em prol do crescimento econômico de maneira sustentada, ainda dificultada pela rigidez ambientalista de seu Ministério do Meio Ambiente que trava iniciativas como a exploração de petróleo na Margem Equatorial e outras iniciativas que poderiam melhorar a infraestrutura logística do país, mesmo com investimento privado.
Assim sendo, talvez tudo tenha que ser resolvido daqui a alguns anos, por outro governo. Sem uma alternativa de retomada do crescimento e negociação de regras fiscais mais rígidas, a tendência é que haja pressão para um governo com política radical de corte de gastos, nem que seja com desvinculação das despesas previdenciárias dos aumentos do salário mínimo, conforme sugeriu Armínio Fraga, recentemente. Essa solução, à la Milei, teria que ser negociada não só com o Congresso, mas com os “guardiães da Constituição” (se é que entendem).