
Lorenzo Carrasco
No domingo 8 de junho, celebrou-se em várias localidades do Brasil e de Portugal a Festa do Divino Espírito Santo, tradição de mais de sete séculos que remonta ao notável impulso civilizatório gestado pelo extraordinário casal real português, D. Dinis (1261-1325) e Santa Isabel de Aragão (1270-1336), criadores do que alguns autores chamam o Projeto Áureo ou Império do Espírito Santo.
Além da criação da então chamada Festa da Coroação do Imperador do Espírito Santo, o Projeto Áureo de D. Dinis e Isabel de Aragão incluiu: a proteção à Ordem dos Templários após a sua extinção, convertendo o seu capítulo português na Ordem de Cristo, futura impulsionadora das grandes navegações do século XIV; a plantação de pinhais para a construção naval e a criação da Marinha; a criação da Universidade de Lisboa (depois transferida para Coimbra); e a oficialização da língua portuguesa.
A festa, realizada pela primeira vez em 1296, foi idealizada pela rainha Isabel e tinha como ato principal a coroação simbólica de um Imperador do Espírito Santo, sempre uma criança ou um homem pobre do povo. Igualmente, havia a libertação de presos e a distribuição de alimentos, na qual a rainha tomava parte diretamente e nobres e pobres compartilhavam uma mesma mesa sem distinção de classes.
Em Portugal, a devoção à Santíssima Trindade e ao Espírito Santo, herdada diretamente da Ordem dos Templários, que teve participação direta na criação do país, no século XII, foi uma ideia-força crucial nos primeiros séculos da história lusitana. A Festa do Divino Espírito Santo constituía uma espécie de preparação espiritual do povo para o advento do Império do Espírito Santo, uma era de prosperidade e justiça em que a vida da sociedade seria regida pelos mais elevados princípios cristãos.
Nos séculos seguintes, a festa acompanhou a expansão portuguesa, levada pela Ordem de Cristo, tendo sido acolhida, em especial, nos Açores e no Brasil, mas, com a morte de D. Manuel I e a extinção da ordem, em 1521, passou a ser combatida pela Inquisição e seus praticantes experimentaram perseguições. Muitos dos degredados que foram enviados ao recém-descoberto Brasil eram “festeiros do Divino” e cristãos-novos (judeus convertidos) perseguidos pelo Santo Ofício.
A persistência dessa bela tradição até os dias de hoje é evidência da força do simbolismo original com o qual foi criada, como se fosse uma recordação daquela aspiração latente por um futuro digno dos ideais cristãos.