
Wellington Calasans
O Turcomenistão, país estratégico localizado na Ásia Central e vizinho do Irã, tornou-se recentemente palco de uma intensificação das disputas geopolíticas entre os Estados Unidos, a Rússia e, de forma menos visível, a China.
Embora a mídia e o debate diplomático se concentrem na competição entre Washington e Moscou, a presença crescente da China no cenário regional pode ser o fator determinante para o desfecho dessa disputa, dada sua influência econômica e infraestrutural global.
A visita do Ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, a Ashgabat, e as conversas telefônicas de altos representantes norte-americanos com autoridades turcomenas destacam a importância do país como ponto de convergência de interesses energéticos e geopolíticos.
O Turcomenistão, detentor da quarta maior reserva de gás natural do mundo, é fundamental para projetos de exportação para a Europa via Turquia e Irã, além de ser uma rota crítica para o escoamento de recursos durante crises regionais, como o conflito iraniano-israelense.

A Rússia, tradicionalmente hegemônica na região, busca manter sua influência cultural e econômica, exemplificada pelos planos de criar uma universidade russo-turcomena e fortalecer laços com jovens diplomatas.
Já os EUA, por sua vez, tentam ampliar sua presença por meio de cooperação comercial e garantias de segurança, como a recente facilitação de saída de cidadãos norte-americanos do Irã via Turcomenistão.
Aqui surge o papel da China, que, embora não mencionado diretamente nos eventos recentes, tem condições únicas de moldar o futuro do país. Como parte da iniciativa Belt and Road (Cinturão e Rota), Pequim já investiu bilhões em infraestrutura na Ásia Central, incluindo gasodutos que atravessam o Cazaquistão e o Uzbequistão até a fronteira chinesa.
O Turcomenistão, por sua riqueza em recursos e localização estratégica, poderia se tornar um hub energético crucial para a China, reduzindo sua dependência de rotas marítimas e ampliando sua influência continental.
Além disso, a construção de um aeroporto em Jebel, discutida em contextos militares russos, ganha novas dimensões se considerarmos o potencial uso por potências asiáticas para projetos de logística ou monitoramento regional.
Enquanto Rússia e EUA disputam a primazia tradicional, a China atua de forma mais discreta, focando em parcerias de longo prazo e investimentos em infraestrutura. Sua capacidade de oferecer financiamento sem pressões ideológicas atrai governos como o de Ashgabat, que priorizam soberania e desenvolvimento econômico.
Para que a China se torne um elemento determinante, bastaria intensificar negociações para expandir a exportação de gás turcomeno para mercados asiáticos ou integrar o país à rede de comunicações e transporte da Nova Rota da Seda. Isso não apenas alteraria o equilíbrio de poder na região, mas também reduziria a dependência do Turcomenistão em relação a potências ocidentais e melhoraria com as vizinhas, como a Rússia.
Em resumo, a disputa pelo Turcomenistão transcende a rivalidade imediata entre EUA e Rússia. A China, com seu modelo de diplomacia econômica e projetos de conectividade global, possui as ferramentas para desempenhar um papel decisivo.
O envolvimento chinês, porém, depende da capacidade de dialogar com Moscou e de conter Washington no uso do condicionamento de exercer pressão para obter exclusividade. Não demora, vamos ouvir a imprensa domesticada fazer reportagens sobre a importância da “democracia” no Turcomenistão. O truque é velho.
Responder às ambições de Ashgabat por diversificação de parcerias e desenvolvimento é o desafio. Enquanto isso, o cenário permanece volúvel, abrindo mais uma frente de tensão na complexa dinâmica geopolítica do início deste século.