Você é micro, médio ou pequeno empresário, adere ao Simples, diz COM TODA RAZÃO que abrir uma empresa no Brasil é praticamente um crime, quer menos impostos, mais liberdade econômica e se considera liberal. Você deveria estar preocupado com a reforma tributária do “Posto Ipiranga”.
A proposta é fazer a unificação da tributação com a criação da Contribuição por Bens em Serviços (CBS) de 12% e substituição da PIS/COFINS de 3,65%, que é o Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA). Isso colocaria fim na bitributação.
HOJE:
A vende mercadoria para B.
Valor: R$100
PIS e COFINS: 3,65% = R$3,65
B vende a mercadoria para C.
Valor: R$150
PIS e COFINS: 3,65% = R$5,47
C vende a mercadoria para o consumidor final D.
Valor: R$200
PIS e COFINS: 3,65% = R$7,30
Total recolhido nessa cadeia = R$16,42
DEPOIS:
A vende mercadoria para B.
Valor: R$100
CBS: 12% = R$12,00
B vende a mercadoria para C.
Valor: R$150
CBS: 12% = R$18,00 (-R$12,00) = R$6,00
C vende a mesma para o consumidor final D.
Valor: R$200 CBS: 12% = R$24,00 (-R$18,00) = R$6,00
Total recolhido na mesma cadeia = R$24
Estão copiando a sistemática do ICMS para essa contribuição federal. Ela se chama “não cumulativa” porque, basicamente, você desconta o que incidiu na operação anterior.
Reparou no aumento expressivo no valor de quem criou o produto/serviço? Antes o criador pagava 3,65%, mas todo mundo também pagava de novo, sem “aproveitar” o que os anteriores pagaram. Agora imagina um empreendimento qualquer, que no Simples vai deixar de pagar 3,65% e pagar 12%.
Isso só é bom para quem tá no meio da cadeia e agrega pouco valor. Quem produz qualquer coisa, principalmente tecnologia, vai levar na jugular, especialmente se produz diretamente para o consumidor final.
O setor de serviços simples vai entrar em desespero. Pra ele tanto faz se é cumulativo ou não, já que ele participa de uma cadeia de produção compacta, sendo ele o início e o fim. Para além de ter uma nova sistemática bem mais complexa, também poderá sofrer com o aumento expressivo nos seus custos.
Vamos dizer que você faz marmitas pra vender por 10 reais. Hoje você paga R$0,36, mas vai passar a pagar R$1,20 e inevitavelmente repassará o valor ao consumidor. Isso vale para quem tem uma lojinha, uma academia, uma escola de línguas – para qualquer serviço que não gere crédito e atenda ao consumidor final.
A legislação de PIS e Cofins é complexa? Muito! Mas os escritórios e programas de escrituração já estão configurados para lidarem com essa complexidade. O efeito real e imediato da mudança é atolar todos os serviços e produtos com muito mais tributo (3,65 pra 12%).
De fato, em uma cadeia muito longa, o PIS/Cofins de 3,65% cumulativo pode realmente atingir valores absurdos (embora tenham sido criadas soluções como a incidência monofásica, visando contornar esses casos). Realmente, é algo que precisava mudar, mas a solução anunciada está longe de facilitar a vida do empresário brasileiro. Quem tem uma empresa pequena está lascado! Será mais um sucesso para a famosa franquia “passa-se o ponto”, ou para aquela outra “aluga-se”.
No fim das contas, cerca de 70% das empresas atingidas migrarão obrigatoriamente do regime cumulativo para o não cumulativo, passando de uma incidência de 3,65% sobre a receita bruta para um de 12% e terão de apurar créditos oriundos das etapas anteriores para compor sua estrutura de custos. Sob o pretexto de favorecer as longas cadeias de produção, irão enforcar todas as pequenas empresas, lojas, academias, restaurantes, escolas, consultórios de saúde, construção civil.
O que está sendo discutido é um conceito (modernidade, gestão, simplificação, IVA), mas não a economia real do país. Depois de tudo feito, vão colocar a culpa nos juros e na inflação que “apareceu”. Bolsonaro será visto como o cara que subiu impostos, e Guedes como o sujeito que modernizou a tributação e simplificou a legislação.
E você que é empresário, ao criticar Guedes, será acusado de esquerdista ou comunista – e, na verdade, você apenas quer trabalhar e garantir o seu sustento. A estratégia visa iludir os liberais mais empenhados, já que no fundo visa favorecer o mercado de capitais e não a economia real.
Na prática, o chefe da economia se mostra um sujeito que acha que vai consertar a realidade mudando o processo, jurando de pés juntos que vai trazer algum resultado. Balela.
Sem uma técnica voltada ao desenvolvimentismo e ao industrialismo, como é que você vai fazer esse povo falido consiga, de um momento para o outro, criar uma realidade favorável? Só porque mudou a estrutura de tributos? Qual a política para inserir milhões de pessoas de volta às cadeias de produção?
De fato, como muitos adoram dizer, o mercado regula sozinho a vida dessas pessoas. É simples: elas morrem, porque não participam dele. É assim, sempre foi assim. Os pequenos, que não compreendem os truques do sistema tributário estão tremendo e com toda razão! Afinal, eles são o alvo.
E isso tende a aumentar a arrecadação? Provavelmente, mas à custa de quê? Não há dúvidas de que parte desses recursos acabarão revertidos em auxílios (a renda básica se anuncia). Outra parte certamente será destinada a custear os juros crescentes que os “analistas de mercado” estão exigindo do governo.
Ao fim, os preços irão subir, os impostos irão aumentar, as pequenas empresas irão falir – mas o Guedes quer separar “itens de luxo” dos chamados “essenciais”, tabela que ainda não foi divulgada e está sendo parida estado por estado em função do confinamento na pandemia.
Em síntese, com esse aumento da tributação sobre consumo, as coisas ficarão mais caras, e não vão faltar justificativas para encobrir a trapaça.
Por fim, repito: se você é micro, pequeno, médio empresário e liberal, deveria muito se preocupar com esta reforma tributária, pois o Guedes não gosta de você. Ele é liberal SOMENTE no mercado de capitais, não na economia real. E se você está caindo no conto do mercado de capitais, que não seja por falta de aviso – lembre-se daquele ditado: saco vazio não para em pé (a não ser que ele seja virtual).
Se você é de “oposição”, deveria estar atento também, porque o projeto que vem depois da sua turma é assinar embaixo de tudo, com a promessa de distribuir as migalhas por meio de cotas, bolsas, auxílios, regados com bastante identitarismo para dizer que vão favorecer “negres, mulheres e LGBTQ+”, tudo com selo verde – já que o desenvolvimentismo e industrialismo são uma ameaça ao meio ambiente e às populações indígenas.
É tudo um grande teatro!