Em Tropa de Elite, dirigido por José Padilha, assistimos ao cotidiano de um oficial do BOPE da Polícia Militar do Rio de Janeiro, o Capitão Nascimento, responsável por comandar operações armadas contra o narcotráfico carioca e treinar recrutas. No final do filme, o oficial comanda uma operação para caçar o chefe do tráfico responsável pela morte brutal de um aspirante, por ele treinado.
Na continuação, Tropa de Elite 2, o Capitão Nascimento já deixou o BOPE, mas se põe a investigar a ligação de policiais com a milícia e com políticos. Daí o subtítulo, “o inimigo agora é outro”, dando a entender que o crime tem amplas ramificações. Um dos mocinhos coadjuvantes é o deputado Fraga, militante dos Direitos Humanos, casado com a ex-esposa de Nascimento.
Na verdade, a continuação foi uma resposta de Padilha às críticas que recebeu, pela Esquerda, dos que se identificam com a personagem Fraga – inspirada em um deputado de nome parecido, de que o primeiro filme teria características “fascistas” ao estetizar e glorificar a violência, dada a apoteose onde Sargento Mathias executa o chefe do tráfico Baiano com um tiro de escopeta à queima-roupa. Não à toa, este personagem acaba morto no segundo filme.
Poderíamos então imaginar um roteiro para um terceiro filme, com o seguinte argumento: a associação, na mesma cidade do Rio de Janeiro, de uma facção do narcotráfico, que prima pela violência excessiva, mesmo contra as forças policiais, com instituições de Estado como o Judiciário e o Ministério Público, partidos políticos e organizações não governamentais (ONGs).
Nesta hipotética continuação, a polícia civil e a polícia militar encontram-se de restringidas de atuar, por decisões judiciais cabendo a elas comunicar todas as suas atividades de repressão ao narcotráfico previamente ao Ministério Público. Em uma das ações, as forças policiais sofrem uma emboscada do tráfico altamente armados, com fuzis e armas antitanques, já que informações sobre a operação vazaram para a facção criminosa. A operação acaba por ser muito mais violenta do que o normal, com a morte de um policial e de vários membros do tráfico, armados até os dentes.
Em meio a isso, as operações policiais sofrem marcação cerrada da mídia, liderada por um grande emissora, que compõe um dos maiores grupos empresariais do país, em guerra com o Presidente da República. A mídia, amparada pelos mesmos partidos, ONGs e intelectuais acadêmicos, tenta associar o presidente aos grupos milicianos, rivais da facção criminosa no controle armado de comunidades carentes na cidade, fazendo vista grossa para atuação dessa mesma facção, que alicia afrontosamente menores de idade para entrar para suas fileiras, além de se dedicar ao roubo de cargas e latrocínios em geral, escondendo-se nas comunidades que controla, onde a polícia não pode persegui-la, já que se encontra judicialmente impedida para tal.
Com a operação mal sucedida, a mídia tenta criar um clima de comoção social, acusando a polícia de cometer uma chacina. O atual presidente, um político de Direita, é responsabilizado indiretamente pela ação, já que um aliado seu comanda o Estado do Rio. Ao presidente também recaem a responsabilização por uma grave crise sanitária e pelo desmatamento desenfreado da Amazônia. Este mesmo presidente foi eleito diante de uma grave crise política, na qual a mesma mídia que o ataca, responsabilizou o grupo arquirrival do atual presidente, de Esquerda, a quem foi atribuída uma grave crise econômica e um grande escândalo de corrupção.
A crise do governo anterior reforçou o papel do Judiciário e do Ministério Público, que terminaram por processar e julgar vários quadros políticos do grupo político que controlava a presidência. Fortalecidos, eles voltam suas baterias para o atual presidente e seu grupo político, interferindo em nomeações de cargos, em decretos do Executivo, na atuação das policiais e mesmo no modelo do sistema eleitoral, impedindo mesmo o Legislativo de atuar nesses pontos.
A operação policial, definida pela mídia como “chacina”, é o estopim para que autoridades brasileiras sejam responsabilizadas em cortes internacionais, ainda que, para isso, o país precise sofrer sanções da chamada “comunidade internacional”, aproveitando a narrativa de abuso do Estado. Os países da “comunidade internacional”, cabe lembrar, são os mesmos que financiam ONGs e estudos acadêmicos que tentam mostrar que as forças policiais cometem “genocídio”, como também que o país é um vilão ecológico, que as instituições de Estado são – especialmente as do Executivo – endemicamente corruptas etc.
Eis então que o nosso velho personagem, o aposentado Nascimento, recluso e ciente do déficit de liderança que assola o país, toma consciência que os estudos de estratégia que recebeu na Academia do BOPE são insuficientes para confrontar os desafios que se impõem, já que a crise é muito mais do que uma “questão de polícia” e que o “sistema” é muito mais foda do que imaginava antes. A guerra é muito mais ampla do que imaginava.
Mas tudo, é claro, não passa de ficção.