Por Rodrigo Wentzel Vieira de Mattos.
O governo Bolsonaro vive de narrativa, mas este também pode ser o seu calcanhar de Aquiles. O que ainda sustenta sua candidatura é a briga de narrativas da esquerda contra ele e vice versa. Só a esquerda e a grande mídia não repararam isso ainda e fazem o seu jogo sem reconhecer o seu terreno que pisam. O Bolsonaro pode não entender nada sobre raison d’État, pleno emprego e desenvolvimento, mas entende como funciona as disputas na pós-modernidade. Em política não se pode destituir de racionalidade quem se mostra hábil em movimentar multidões.
A questão é que o Bolsonaro sabe mobilizar algumas causas relevantes e joga para a massa, sabendo que como é ele quem apoia tal ou qual causa, a esquerda será contra sem ponderar absolutamente nada e seguirá a agenda midiática de Washington D.C em seu lawfare buscando o estrangulamento do governo. Nesse jogo, o Bolsonaro se beneficia, pois fica como o único a defender tal ou qual tema que, na grande maioria das vezes, independem ser de direita ou de esquerda para defender.
Alguns exemplos: (1) disputar com o STF objetivando a redução dos arbítrios dos ministros que agem com ativismo judicial e excessiva judicialização da política que não surgiram do nada, bem como outrora fora parte do discurso da esquerda, agora, ela finge não saber que existe e que é um problema gravíssimo para a República; (2) melhorar a auditoria das urnas que foi considerada inconstitucional em uma decisão do STF completamente absurda que só se fundamenta no antibolsonarismo por motivos sentimentalistas em defesa de uma tal “democracia” que nem eles mesmos sabem do que estão a dizer com isso; ou, por fim, (3) questionar certos exageros sanitaristas.
Embora ele perca a razoabilidade frequentemente neste ponto, às vezes o ponteiro acerta a hora. Pois vejamos alguns dos acertos que jamais serão admitidos pela esquerda.
Bolsonaro acertou em lutar contra o exagero sanitarista de fechamento absoluto das Igrejas, que foi usado politicamente para testar o quanto de arbítrio do Estado os fieis aceitam sem reclamar. Num primeiro momento, foi razoável o fechamento, mas num segundo, à época do julgamento do STF, foi totalmente exagerado. Tanto que, em Niterói, município que tem sido elogiado internacionalmente no combate ao Covid-19, as Igrejas abriram com 10% da capacidade sem anular o direito à liberdade religiosa. Assim como também é razoável o Bolsonaro questionar o excesso na retirada de direitos e garantias fundamentais para quem não queira se vacinar pelos mais diversos motivos, ainda que não se concorde com nenhum deles.
Para se ter uma ideia, na Europa, é a esquerda quem levanta as questões dos abusos sanitaristas. O primeiro a questionar os abusos sanitaristas foi Giorgio Agamben, filósofo notoriamente comunista. E o núcleo do seu diagnóstico, apesar de conter alguns exageros, foi certeiro: as políticas sanitárias substituíram a guerra ao terror no acirramento dos Estados de Sítio permanentes, favorecendo o neoliberalismo na destruição dos direitos e garantias fundamentais. Basta ver que hoje em dia até o Talibã é considerado “moderado” na política internacional estadunidense.
Enfim, é assim que o Bolsonaro vence a disputa de narrativas sem precisar fazer nada. Tanto que ele efetivamente perdeu em todas as vezes que disputou politicamente, o que acabou por favorecer o discurso de “perseguido” e ele vence no somatório final das disputas no campo da representação sociológica. Tirem dele a narrativa com a verdade efetiva, sem sentimentalismo, e não lhe sobra nada, pois ele, efetivamente, não defende nada. Todas as suas defesas são meros palavrórios sem o menor decoro que, na maioria esmagadora das vezes, acaba por perder credibilidade.