Por Felipe Quintas.
O projeto de construção de trens de passageiros aventada pelo Lula tem mais chance de vingar hoje do que há 10 anos atrás, no tempo do “trem-bala”, por conta de toda pressão interna e externa pela “transição energética”. O enfraquecimento do modelo rodoviário naturalmente forçaria a Petrobrás a diminuir seu foco em petróleo e derivados.
Isso pode ser bom ou ruim, dependendo de como seja feito.
O Brasil pode construir uma indústria metal-mecânica nacional a partir da construção de ferrovias públicas que deem ao Estado maior controle territorial, como os EUA, a Alemanha, a Suécia, a Rússia e o Japão fizeram no século XIX e a China faz hoje, o que inclusive poderia alimentar por outros meios a atuação tradicional da Petrobrás.
Ou pode lotear a malha ferroviária entre concessionários privados escusos sem o menor interesse em associar a fabricantes nacionais, o que significaria voltar ao modelo do Império e da República Velha, que não trouxe mais dívidas do que ganhos para o Brasil. O atenuante de hoje em relação aquela época é que agora temos o BNDES, que pelo mantém os esquemas de financiamento dentro de casa.
Considerando as políticas de infraestrutura no Brasil nos últimos 30 anos, caracterizados pelo modelo de concessão privada que na verdade mais parece fachada para outras coisas, acho mais possível o segundo caso, em que o Brasil perderia as vantagens do rodoviarismo (Petrobrás e indústria de transformação petroquímica fortes) sem alcançar as vantagens do ferroviarismo.
Também é possível que devido às deficiências executivas do Brasil não saia praticamente trem nenhum e a gente continue na mesma, mas jogando mais dinheiro fora e diminuindo expectativa de investimento em outras áreas.
Como acredito muito no Brasil, tenho a esperança que o Brasil saberá desenvolver e tirar proveito dos dois modelos. O próprio fato das ferrovias voltarem a fazer parte do discurso público sinaliza uma mudança de época. Cabe à política direcionar essa mudança para os objetivos estratégicos do Brasil.