
O Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, surfou recentemente numa onda de popularidade. Mostrou que sabe jogar o jogo político, e mesmo nas adversidades de uma pandemia, conseguiu o feito de crescer em popularidade entre as classes econômicas mais baixas da população.
Alguns analistas à esquerda atribuíram a façanha única e exclusivamente ao fato do auxílio emergencial ter sido aprovado no Congresso Nacional com o valor de 600 reais – e não de apenas 200, como era o desejo da equipe econômica. Já outros analistas mais à direita argumentam a ascensão de Bolsonaro como sendo única e exclusivamente devida ao suposto crescimento de uma “direita cultural”, no intuito de dizer que Brasil estaria passando por alguma espécie de despertar. Em qualquer caso, impera um misto de estupidez, torcida e uma porção generosa de má-fé.
Em clima de polarização, as análises vão ficando cada vez mais parciais e apaixonadas, perdendo assim o sentido de análise propriamente dita. Cada time quer narrar um espetáculo para sua torcida organizada, ignorando obviamente que somos um só país. A disputa pelo poder é importante, faz parte do modo de operar a política. Entretanto, essa disputa em hipótese alguma poderia ser mais importante do que a questão nacional.
Teto de gastos: que teto é esse?
O popularmente chamado Teto de Gastos é, na verdade, uma Emenda Constitucional que alterou a Constituição Federal de 1988 para instituir um novo regime fiscal. Em verdade, depois de tantas emendas, uma Constituição que já fora considerada super-rígida, na classificação do Min. Alexandre de Moraes, já não esboça a menor resistência. O que se altera é, em verdade, o pacto popular – sem que o povo tenha a menor compreensão do que se passa.
Basicamente, proíbe o governo brasileiro de aumentar os gastos públicos durante 20 anos. As despesas e investimentos públicos ficam limitadas aos mesmos valores gastos no ano anterior, corrigidos pela inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Levando em conta um ano em que os investimentos foram irrisórios – já no espírito de desconstrução do Estado Brasileiro -, praticamente eterniza o estágio falimentar em que se encontra a nossa civilização. Por esse motivo, a Emenda Constitucional 95, recebeu nome muito mais apropriado: a Emenda Constitucional da Morte. A retórica vinculação percentual excepcional conferida à saúde e educação, por vezes referida de “tratamento diferenciado”, condena o país ao rumo das ondas.
A realidade é impositiva
O Brasil passa por uma grave crise. As pesquisas da última semana já mostram Bolsonaro tropeçando onde havia ganhado terreno. O anúncio da diminuição do valor do auxílio emergencial, combinado ao baixo investimento público destinado à retomada do crescimento, broxaram setores da sociedade que esperavam um plano altivo e sólido para o pós-pandemia. Com uma queda vertical do PIB – que já não encontrava mais para onde cair -, e com uma equipe econômica sofrível e duvidosa, ninguém arrisca apostar no país. A fuga de capital estrangeiro continua a galope, mesmo com a diminuição de agosto; os preços dos alimentos decolam, apesar do apelo do presidente ao patriotismo dos empresários varejistas.
Neste exato momento, países do mundo inteiro reveem seus planos econômicos. Ao atravessarem um período de excepcionalidade, todos estão recorrendo à potência do Estado para salvar suas economias, num compromisso inarredável de poupar seu povo de um colapso social.
Já no Brasil, ao que parece, a vontade de Bolsonaro conservar sua ascensão de popularidade está sendo sabotada pela equipe econômica, sempre com a desculpa rasteira do “teto de gastos”.
O país se depara uma queda no PIB próxima de 10%, e sofre incontáveis derrotas no âmbito do comércio internacional. Para além dos índices numéricos, revive uma perigosa pressão inflacionária – já percebida pelo povo, e que sempre foi responsável por drenar rapidamente o apoio popular.
Não se sabe quem assopra nos ouvidos do presidente, mas é importante que alguém o avise: se o povo não tiver trabalho, se não tiver como comprar seu alimento, não existirá ideologia e nem discurso que mantenha sua popularidade em alta. Ou Bolsonaro fura o teto, ou o teto cairá sobre sua cabeça.