Foi publicado no dia 31/3 último um “Manifesto pela Consciência Democrática”, assinado por Eduardo Leite, João Dória, Luiz Henrique Mandetta, João Amoedo, Luciano Huck e… Ciro Gomes. O manifesto faz referência a que, três décadas depois da promulgação da Constituição de 88, a “democracia brasileira” estaria “ameaçada”.
Ciro Gomes, o único desses que se colocou, desde a eleição de 2018, na oposição a Jair Bolsonaro, vem se afirmando como defensor de um “projeto nacional de desenvolvimento”, mas nesse manifesto juntou-se a governadores tucanos e um ex-ministro de Bolsonaro. João Dória elegeu-se com base no “Bolsodória”, entrando de papagaio de pirata no palanque do então candidato a presidência, a quem depois desancou desde que assumiu o Governo de São Paulo. Dória que acumula desafetos até mesmo no próprio partido, a começar pelo ex-governador Geraldo Alckmim, a quem abandonou na mesma campanha, em claro oportunismo.
Eduardo Leite, por sua vez, procura seu lugar ao sol dentro do PSDB, de olho na grande rejeição de Dória. Quer se tornar nacionalmente conhecido por realizar um rígido confinamento no Rio Grande do Sul, diante da explosão da pandemia no Estado, mandando cobrir, em seu decreto, até mesmo seções dos supermercados que contenham produtos definidos como “não essenciais”. Contudo pode mesmo é ficar mais conhecido por privatizar a Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica (CEEE-D) em um leilão com apenas um lance, do Grupo Equatorial, que arrematou tudo por apenas R$ 100 mil reais. Isso em um momento de possível contração da atividade econômica, em função do confinamento, que deve levar a uma muito provável queda na arrecadação. Lembrando que o Rio Grande do Sul enfrentou problemas sérios nas finanças públicas na gestão passada.
Já Luciano Huck e João Amoedo tem em comum a ligação com o Itaú: o primeiro como garoto-propaganda e o segundo como ex-executivo, que inclusive tomou do banco a cor laranja como símbolo do partido que criou, o Novo. O mesmo Itaú que arrematou a BR Distribuidora, em privatização de uma subsidiária de uma estatal, sem autorização do Congresso Nacional, mas com aval do Supremo Tribunal Federal na figura do Ministro Luís Roberto Barroso.
Mas, enfim, a formação de alianças faz parte do jogo político, mas qual o sentido de construir uma “frente ampla” com as referidas figuras? Uma suposta ameaça de golpe de Bolsonaro, cada vez mais acuado? Para marcar posição em uma data comemorada por uns, repudiada por outros, de acordo com os algoritmos que estruturam as redes sociais?
Vamos pensar no Brasil Real, no país não-oficial, no Brasil Profundo, daqueles que não ficam ligado na Globonews… A maior preocupação da imensa maioria do povo são os efeitos das medidas de combate à pandemia no dia-a-dia, no ganha-pão de cada dia, no funcionamento do comércio local, tendo em vista que o setor de serviços é o grande empregador do país. De uma forma ou de outra, essa mesma população é bombardeada por mensagens e vídeos, feitos pelo núcleo bolsonarista, devolvendo a acusação e apontando prefeitos, governadores e juízes como ditadores, ao imporem decretos de restrição à atividade econômico, que limitam o funcionamento de diversas atividades, consideradas “não essenciais”. Mas que, contudo, empregam e dão renda a milhões.
Então, de um lado, temos um manifesto de políticos tradicionais querendo fazer um aceno à esquerda ou aos “liberais esclarecidos” e, de outro, o governismo atacando outras lideranças como ditadores, em nome da liberdade de ir e vir, de exercer sua atividade econômica, mesmo em um contexto de pandemia que está ceifando milhares de vidas a cada dia. Cada um dos lados coloca-se como defensor da Liberdade antes da Ordem, cada qual a seu jeito. Ou seja, o que há é um choque de narrativas liberais.
Para imensa maioria do povo, políticas de confinamento (lockdown) sem substancial apoio financeiro do governo não são uma alternativa viável. Muito mais necessário do que um manifesto que faz referência a fantasmas do passado, do tempo da Guerra Fria, quando as Forças Armadas exerciam a hegemonia do Partido da Ordem, precisamos de uma união das diversas forças políticas para a constituição de políticas de renda, de manutenção da atividade econômica e de recuperação da atividade do Estado para planejamento e reestruturação da produção, digna de um esforço de guerra, para debelar os efeitos da pandemia em sua fase mais severa. Ainda que, para isso, tenha que se romper com dogmas do neoliberalismo brasileiro, como o Teto de Gastos e o privilégio do pagamento de juros e amortização da dívida pública em relação aos demais gastos governamentais.
Ou seja, ao invés de falar para aqueles que estão com a geladeira vazia, afogados em dívidas, o manifesto prefere falar à classe média intelectualizada, que muitas vezes tem emprego estável ou em melhor condição de “empregabilidade”. Setor esse que ainda sabe distinguir Harvard de Chicago.
Trocando em miúdos,Ciro Gomes,nao irá conseguir nada com isso!!
Um discurso mais voltado ao povo,seria a forma mais viável de captaçao de votos. Mas ele prefere sinalizar ao mercado,mostrando que na figura dele nao existe bicho papao.