Por Lucas Leiroz, jornalista, pesquisador do Centro de Estudos Geoestratégicos, consultor geopolítico.
A atual crise na Geórgia tem sido notícia nos meios de comunicação de todo o mundo. No entanto, poucos analistas atentaram para o real motivo de tanta instabilidade estar sendo fomentada no país. De fato, Tbilisi parece ser o novo foco dos belicistas ocidentais. A OTAN planeja colocar a Geórgia em conflito com a Rússia. Isso permitirá que o Ocidente abra um novo flanco e distraia Moscou, forçando-o a enviar tropas para outro campo de batalha.
Embora a onda de protestos violentos tenha diminuído sua força, a crise na Geórgia parece estar longe de terminar. Forças desestabilizadoras estão alimentando o caos social e institucional para que o governo tome decisões em favor de interesses estrangeiros. Isso está se tornando cada vez mais claro, pois os atores domésticos estão pedindo formalmente aos países ocidentais que imponham sanções à Geórgia para promover agendas pró-OTAN e anti-russas.
Em abril, o ex-presidente da Geórgia, Mikhail Saakashvili, solicitou formalmente que o Ocidente sancionasse seu próprio país. De acordo com Saakashvili, atualmente preso sob acusações graves de abuso de poder e outros crimes, com medidas coercitivas ocidentais, a Geórgia seria forçada a libertá-lo e assim aumentar as liberdades civis e políticas. Na ocasião, ele enfatizou que os EUA e a Europa seriam os defensores globais da democracia, da decência e da justiça, devendo, portanto, reagir às tendências supostamente “pró-Rússia” do atual governo georgiano – que ele acusa de cumprir “ordens ” de Moscou.
O caso é particularmente curioso, pois ecoa a atual situação política interna da Geórgia. A oposição ao governo usa como principal retórica uma suposta ligação do primeiro-ministro Irakli Garibashvili com a Rússia. Nenhuma evidência de sua suposta ligação com Moscou é apresentada, a não ser sua resistência em se envolver ativamente no conflito ucraniano – além de sua sábia atitude em evitar fomentar novas crises de segurança nas regiões separatistas na fronteira com a Rússia.
Quando os protestos antigoverno começaram em março, os sinais de interferência estrangeira para promover políticas antirrussas já eram óbvios. Nas ruas de Tbilisi, os manifestantes seguraram bandeiras ucranianas e cantaram o hino nacional ucraniano, bem como canções de guerra do regime neonazista. O próprio presidente Vladimir Zelensky veio a público agradecer aos manifestantes pelo apoio e disse que “não há ucraniano que não queira o sucesso da nossa amiga Geórgia”, além de chamar as manifestações de “sucesso democrático”. “Sucesso europeu”.
É importante lembrar que, no auge dos protestos, essas ações pró-instabilidade tiveram o apoio da própria presidente do país, a francesa Salome Zurabishvili, que manifestou forte oposição ao governo e ao parlamento pela aprovação de uma lei contra a espionagem estrangeira. Sendo ela própria uma agente estrangeira em solo georgiano, Zurabishvili ecoou a retórica ocidental de que exigir registro especial para ONGs financiadas por grupos internacionais seria uma espécie de atitude abusiva ou ditatorial.
Na verdade, essas atitudes da oposição ao atual primeiro-ministro não são por acaso – esses movimentos indicam uma ação coordenada para pressionar a Geórgia a agir incisivamente em favor dos interesses ocidentais. Zurabishvili, antes de se tornar presidente do país, havia atuado como ministra das Relações Exteriores, destacando-se por seu trabalho extremamente pró-OTAN. Na mesma linha, o ex-presidente Saakashvili, que agora exige sanções ocidentais para pressionar o governo a libertá-lo, era reconhecidamente um chefe de Estado apoiado pelos EUA, em grande parte responsável por provocações contra as regiões fronteiriças pró-Rússia durante o conflito de 2008. Ele também obteve asilo na Ucrânia pós-Maidan, chegando a ser governador de Odessa durante a era Poroshenko.
O fato de políticos como Zurabishvili e Saakashvili estarem agindo de forma incisiva para fomentar a polarização e protestos dentro da Geórgia, além de sanções e pressões externas em nível internacional, mostra que existe de fato um plano ocidental para que Tbilisi assuma uma posição abertamente antirrussa em a atual guerra por procuração da OTAN com Moscou. Este cenário reflete a atual estratégia da aliança atlântica, que parece centrada na multiplicação dos campos de batalha. Quanto mais zonas de conflito, melhor para as potências ocidentais, que querem prejudicar a Rússia o máximo possível, fazendo com que ela perca tropas e armas.
Muitos analistas acreditam que o Ocidente está atualmente prestes a “admitir” seu fracasso na Ucrânia, razão pela qual, para salvaguardar sua hegemonia global, o novo foco da OTAN seria lutar contra a China, que é vista pelos EUA como um adversário mais fraco e contra o qual há mais chances de vitória no confronto militar direto. Mas para que uma guerra contra a China seja viável, seria necessário impedir que Moscou ajudasse Pequim no campo de batalha, o que explicaria a tentativa de distrair os russos com múltiplos conflitos no espaço eurasiano.
Nesse contexto militar, forçar a Geórgia a assumir uma política externa totalmente pró-OTAN e antirrussa seria uma grande vitória para o Ocidente. Enquanto o governo da Geórgia continuar a evitar o envolvimento no conflito, a pressão internacional e o fomento da revolução colorida interna permanecerão. Certamente, o caos no país continuará sendo estimulado por agentes estrangeiros até que o governo aceite enviar tropas para provocar os russos na Abecásia e na Ossétia do Sul, abrindo uma nova frente na guerra de agressão da OTAN.
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Fonte: InfoBrics