Por Raphael Machado.
Todo apoio a Artsakh e à Armênia e seu povo, de história multimilenar, cultura riquíssima e grandes virtudes. Os armênios, hoje, estão sofrendo um cerco virulento cujo objetivo é a expropriação territorial de uma parte histórica de seu Estado, a região de Artsakh.
É público e notório que existem pretensões expansionistas neo-otomanas, que usam o Azerbaijão como proxy. Essas pretensões estão vinculadas, também, a determinados interesses israelenses e ocidentais e, portanto, de modo geral dirigidas para uma limitação da projeção meridional da Rússia e da projeção ocidental do Irã. Mas, evidentemente, não se trata aí de relações e conexões simplórias e horizontais. A Turquia é mais rival do que inimiga declarada tanto da Rússia quanto do Irã, e o jogo do Erdogan é de longo prazo.
O problema, porém, é que a Armênia foi colocada em uma péssima situação geopolítica, de onde ela terá dificuldades para se livrar favoravelmente no curto prazo. E isso porque o atual governo armênio, dirigido por Nikol Pashinyan, chegou ao poder por uma revolução colorida em 2018. Na prática, a Armênia teve o seu “Maidan” em 2018, a chamada “Revolução de Veludo”, e Pashinyan é o Petr Poroshenko da Armênia.
Desde 2020, porém, mesmo com um governo armênio antagônico e até ocasionalmente hostil, interessado em se distanciar da Rússia e dos projetos eurasiáticos de Moscou e seus aliados, a Rússia tem tentado apaziguar e pacificar as relações entre os países do Cáucaso, o que é dificultado simultaneamente por seu engajamento e dedicação na Ucrânia, pela agressividade azeri e pela própria intratabilidade do governo armênio.
Enquanto isso, as comunidades armênias dos EUA e da França, plenamente ocidentalizadas e de simpatia atlantista, têm instrumentalizado o sofrimento dos armênios do Artsakh e aproveitado a oportunidade para pressionar o governo armênio para se aproximar cada vez mais dos EUA e da França.
Isso tem sido feito de forma acelerada desde o ano passado, com a visita da bruxa Nancy Pelosi à Armênia, levando a boatos sobre a possibilidade de saída da Armênia da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC; composto pela Rússia e as ex-repúblicas soviéticas, excluindo a Ucrânia). Desde então, a Armênia tem se aproximado cada vez mais dos EUA e da França e se afastado da Rússia, perigosamente ameaçando a segurança da Eurásia de várias maneiras.
Ainda assim, a Rússia tem se posicionado no sentido de pacificar o conflito no Artsakh e garantir a integridade da estatalidade armênia. De modo que Pashinyan deveria pensar bem se compensa realmente romper com a Rússia.
Não tem sido comentado que o governo atlantista da Armênia declarou que assinaria o Estatuto de Roma, ingressando no Tribunal Penal Internacional, o que provocaria graves desavenças com a Rússia, além de estar agora sediando exercícios militares conjuntos com os EUA bastante próximo da Rússia, levando instabilidade e perigo para uma região já complexa.
Espalhou-se boatos sobre uma possível invasão do Azerbaijão pelo Irã em resposta ao conflito, por causa do corredor comercial importante para o Irã e que estaria sendo ameaçado pelo Azerbaijão, mas se engana quem se fia excessivamente nisso.
O Irã evidentemente não quer e não pretende aceitar a agressão azeri à Armênia. Mas o Irã está claramente irritado e demonstrou publicamente a sua insatisfação com o governo armênio por sediar exercícios militares com os EUA perto de suas fronteiras, ameaçando também a segurança iraniana.
Se a Armênia decidir romper com a OTSC e inclusive hospedar tropas ianques em seu território, achando que isso lhe oferecerá segurança, isso resultará em uma desnecessária inimizade com a Rússia e o Irã, e não protegerá realmente a Armênia do Azerbaijão e da Turquia. Pobre povo armênio, vítima de seu governo e de suas elites no duro jogo da geopolítica.