Por Horacio Ricciardelli (1944-2023), oficial militar da Força Aérea argentina.
“Conheça seu inimigo, conheça a si mesmo e serás invencível.”
-Sun Tzu.
Por acaso já enviamos antropólogos à Grã-Bretanha para estudá-los como eles fazem conosco? Sejamos humildes, não caiamos na arrogância que fortalece o inimigo. Reconheçamos o quanto temos a aprender com ele, com a vantagem que ele tem sobre nós.
Dissemos que o Império Britânico é herdeiro do império naval de Veneza. A história de como a oligarquia veneziana não se conformou em ficar confinada ao Mediterrâneo e fez o maior movimento de capital da história, o que permitiu a criação da maior frota e, portanto, o maior investimento de capital até aquela data.
O Serviço de Inteligência de Veneza (Conselho dos Dez ou Consiglio dei X) foi o modelo no qual Sir James Walsingham fundou o Serviço Secreto, o atual MI6, em 1580!, tanto em seu conceito geopolítico quanto na subversão interna, desenvolvida nas Guerras Religiosas da Alemanha e em resposta à Liga de Cambrai de 1509, o uso da Universidade de Pádua como recurso de inteligência, o financeiro como fim econômico, sua doutrina de Livre Comércio e o malthusianismo como doutrina antecipada por Gianmaria Ortes.
Até mesmo a capacidade de carga humana do planeta permaneceu inalterada até hoje, nem pelo “think tank” do Clube de Roma, nem por sua consequência, o plano de genocídio planetário: National Security Study Memorandum 200, assinado pelo Secretário de Estado “Sir” Henry Kissinger, o Parlamento no modelo do Grand Consiglio ou o papel simbólico da monarquia como um Doge não eleito, isso e muito mais.
O Império Britânico é herdeiro de Veneza, a começar por seus banqueiros e seu sistema de inteligência.
Somos ignorantes e precisamos enfrentar uma oligarquia imperial com séculos de experiência.
O Império Britânico herdou de Veneza um “Decálogo de Ação” que se tornou a base e os princípios da Estratégia Imperial:
1) Dividir para reinar. Nunca ataque sem antes provocar a divisão interna no inimigo. Reinar incentivando falsas escolhas e liderando os dois lados do conflito. Crie e dirija o maior número possível de lados no conflito: “direita” e “esquerda”, militares e “guerrilheiros” e, se houver muitos judeus, crie as organizações “nazistas”. Use todo tipo de Quinta Coluna para todas as tarefas possíveis.
2) Mercados e não países. O que é importante é o poder econômico e financeiro. Todo poder econômico e financeiro acaba se transformando em poder político, cultural e militar. Que não haja nacionalismo no mercado, pois este pode se perder.
3) Incitar para vencer. Desinformar o Inimigo e, por meio de seus próprios agentes, incitá-lo a atacar quando ele estiver em uma situação estrategicamente desvantajosa.
4) O poder não se mostra. Internamente, ele age por meio de “nativos” que fazem o “trabalho sujo”. Do lado de fora, a ação é tomada por meio de “terceiros países” ou de nativos desses países. Em caso de fracasso, o “agente externo” é responsabilizado.
5) Apoiar o inimigo fraco contra o inimigo forte. Mantenha uma posição isolada enquanto ambos se aniquilam mutuamente. Se possível, travar a guerra por meio de terceiros,
6) A guerra é a última das políticas. A melhor política é enfraquecer e corromper o Inimigo por dentro. É a técnica da “Túnica de Nessus”. A guerra militar deve ser precedida por guerras políticas.
7) Não há amigos ou inimigos permanentes, apenas interesses permanentes. Lealdades religiosas ou ideológicas são deixadas para os incautos. O apoio é dado a quem oferece mais ganhos. Se o outro oferecer algo melhor, a aliança é alterada.
8) Aquele que controla o mar controla o comércio e aquele que controla o comércio controla o mundo. O centro do poder não deve ser deixado em terra, dentro do continente. O poder é exercido desde o porto até o interior do continente.
9) Não é importante perder batalhas, mas ganhar guerras. Em uma Estratégia Total, o poder comercial, financeiro, político, religioso, racial, cultural e comercial de todo o império está envolvido. Uma batalha militar não é uma Guerra Imperial Total.
10) Estratégia sem tempo. Não há prazos, mas metas. Não aja até ter certeza da vitória. O objetivo não é dar ao inimigo um golpe leve do qual ele logo se recuperará, mas um golpe severo do qual ele nunca se recuperará, a menos que seja conveniente para o império que ele se levante novamente para usá-lo contra outro inimigo que surja.
“A guerra é a última das políticas”.
-General von Schlieffen.
Esse é outro dos corolários de Clausewitz, mas talvez seja o que mais se aproxima de Sun Tzu e da tradição britânica. Na verdade, ele deve ser lido como:
“A guerra (militar) é a última das políticas (guerras)”.
A guerra não se reduz mais a um ato de força. Ela é precedida por uma série de políticas pérfidas que possibilitam conhecer o inimigo, desorientá-lo, manipulá-lo, dividi-lo, enfraquecê-lo, isolá-lo de seus amigos, deixá-lo cercado de inimigos e, quando isso acontece, empregar o veneno do agente ou o punhal do assassino. Não vejamos a “Pérfida Albion” como um nobre guerreiro da Idade Média, mas como um cortesão da Renascença que não hesita em usar mentiras, intrigas, venenos ou estiletes. Elementos que foram elevados a uma forma de arte e causaram a ruína de muitos reinos.
Foto: do filme “De Olhos Abertamente Fechados”, de Stanley Kubrick.
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