O presente trabalho tem o objetivo de expor sumariamente a história do pensamento conservador brasileiro nos séculos XIX e XX. Dizemos “pensamento conservador brasileiro” e o adjetivo pátrio é aí essencial porque, infelizmente, existe também um pensamento conservador antibrasileiro, entreguista, um falso conservadorismo que serve de instrumento ideológico de dominação estrangeira, muitas vezes travestido de liberalismo e especialmente caracterizado pela UDN dos anos 1945-66.
O fundador do pensamento conservador brasileiro nos parece ser o próprio pai-fundador da Pátria, o paulista José Bonifácio de Andrada e Silva, Patriarca de nossa Independência.
José Bonifácio foi um grande conservador: seu primeiro objetivo político foi conservar o Reino Unido de Portugal e Brasil, um império luso-brasileiro que se estendia por quatro continentes, do Amazonas ao Timor, que teria sido o grande rival do Império Britânico no século XIX e o assombro do mundo se chegasse aos dias de hoje. Por isso o Andrada aderiu tardiamente à causa da Independência, apenas quando esta se tornou inevitável pela falta de visão da retrógrada burguesia lusitana, que forçava o retorno ao antigo pacto colonial, socialmente superado pela presença da família real portuguesa no Brasil. É digno de registro, porém, que José Bonifácio foi o primeiro prócer do círculo próximo à Corte a tomar a iniciativa favorável à Independência.
Bonifácio era pessoalmente de convicções republicanas: chegou a rascunhar um projeto de constituição para o Brasil, em que o chefe da Nação seria vitalício, porém eletivo, e que previa a deportação sumária para todo o que ousasse propor o restabelecimento da nobreza e da escravidão. Aliás, sua aversão aos títulos de nobreza era notória: recusou todos os que lhe foram oferecidos por Pedro I que, para pirraçá-lo, depois que o Andrada passou para a oposição, conferiu à amante imperial o título de Marquesa de Santos, cidade natal de Bonifácio. Não obstante suas convicções republicanas, o Patriarca abraçou a solução monárquica por patriotismo, pois entendeu, como a história depois o confirmou, que este seria o expediente mais seguro e adequado para obter a independência e a unidade nacional.
Neste país de paradoxos, a independência foi proclamada por um príncipe da antiga metrópole, a monarquia foi organizada por um intelectual republicano e a república feita por um marechal monarquista.
Movido por um patriotismo que o levava até a sacrificar suas convicções pessoais, Bonifácio foi o grande estadista brasileiro do século XIX. Mais teria feito se não tivesse sido preso e deportado em 1823: seus projetos previam não apenas a abolição da escravatura, mas também a incorporação dos silvícolas à comunhão nacional, a abertura de escolas e a construção de estradas ligando as províncias do Brasil. Dois outros projetos, que lograram execução apenas mais de um século depois, saíram da genial cabeça de Bonifácio: a Universidade de São Paulo e a cidade de Brasília. Opunha-se à escravidão, tanto por ser contrária ao direito natural, quanto por inviabilizar a construção de uma Nação coesa e poderosa. Todo o seu pensamento político o grande Andrada resumia numa frase: “a sã política é filha da moral e da razão”.
Em 1831, no término de seu reinado, enfrentando a insatisfação popular generalizada, Pedro I chama novamente Bonifácio, desta vez para exercer a tutela de seu filho, Pedro II, em favor de quem abdicou a coroa imperial. Conta-se que, logo depois da partida de Pedro I, ao ter o primeiro contato com o seu pupilo, um monarca com apenas cinco anos de nascido, o idoso Bonifácio o teria suspendido em seus braços, exclamando com bondade mesclada a sentimentos contraditórios de humildade e orgulho: “meu Imperador e meu filho!”. O incomparável Andrada parece ter tido mais sucesso com Pedro II do que com o primeiro: influiu decisivamente na formação do caráter de nosso segundo imperador. Com o Patriarca, Pedro II aprendeu a amar o Brasil, os livros, as artes e as ciências. A monarquia foi imprescindível para a consolidação da unidade nacional no século XIX e ela não teria se prolongado até 1889 se não fossem as virtudes pessoais de Pedro II.
Getúlio Vargas foi um dos que reconheceram o papel de Pedro II na história nacional: “O seu espírito de tolerância, de moderação e generosidade afetiva, espelhava os traços fundamentais do caráter brasileiro, e essa identidade de temperamento explica, psicologicamente, a admiração e o prestígio populares que lhe aureolaram o nome. Pela austeridade a sua vida de homem bom e justo, ele dominou todo o panorama do Segundo Reinado, pairando acima das competições pessoais, dos partidos e das paixões políticas”.
Por Alberto Monteiro
Extraído de “O pensamento conservador brasileiro” no Portal Bonifácio
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