A esquerda brasileira parece estar eufórica com o Plano Biden: auxílio emergencial para as famílias, anistia de dívidas para pequenos negócios, fundos trilionários para recuperação da infraestrutura (reservadas para empresas e fornecedores nacionais, convém lembrar). Saúdam o quase octogenário presidente dos EUA como o “Novo Franklin Roosevelt”, o mandatário estadunidense a quem é atribuído, normalmente pela historiografia, a recuperação econômica daquele país, pondo fim à Grande Depressão.
Tão inebriados se mostram com o que acontece nos EUA que esquecem que Getúlio Vargas assumiu o poder no Brasil antes de Roosevelt nos EUA e iniciou um programa de recuperação muito mais bem sucedido, tendo em vista que em poucos anos o Brasil recuperou o nível de atividade econômica antes daquela crise. Ao passo que os EUA só se recuperaram totalmente com a II Guerra Mundial, quando colocaram toda a sua indústria para funcionar orientada para a produção militar.
Enquanto anuncia suas medidas sociais para o plano interno, Biden faz medição de forças com a Rússia na Ucrânia e provoca a Turquia, país membro da OTAN, tirando dos arquivos históricos o reconhecimento do genocídio cometido, durante a I Guerra, contra os armênios. Em reação, o presidente turco Recep Erdogan determinou a retirada de pessoal militar estadunidense do território turco, ativando o sistema de mísseis S400 que comprou da Rússia.
Mas se Biden parece estar ganhando um adversário na Turquia, no Brasil vem se acertando com o Governo Bolsonaro, com quem assinou um acordo comercial. Bolsonaro, além de demitir o inútil Ernesto Araújo do Ministério das Relações Exteriores, está alinhando o discurso com a nova administração em Washington até na defesa da “agenda verde”, em um giro de política externa feito em poucos meses. Não por acaso as autoridades sanitárias brasileiras recusaram o uso da vacina russa Sputnik V, quando, independentemente de filigranas jurídicas e tecnicalidades, sabe-se que os EUA vem fazendo pressão contra governos estrangeiros para que recusem a vacina russa.
Ao longo de 2021 observaremos o desenrolar da Geopolítica das Vacinas, em que governos dos EUA e da Europa tentarão impor suas vacinas ao resto do mundo, enquanto Rússia e China usarão suas respectivas vacinas como instrumento de influência, o que se chama de soft power, para se aproximar de outros países do Terceiro Mundo. EUA e Europa só aceitarão turistas que se estejam vacinados com um rol de vacinas que não incluem nem a Sputnik V, nem a Coronavac chinesa.
O cenário mundial continua a briga de foice de sempre, mas no Brasil, tanto a direita como a esquerda, que tanto se xingam e se acusam no ambiente das redes sociais, dominado pelas GAFA (Google, Amazon, Facebook, Apple), parecem se alinhar com a nova moda em Washington, ainda que os EUA percam influência no restante do mundo, em um acirramento do conflito com a Rússia e a China.
Assim, talvez até mesmo a esquerda pare de reclamar do veto a Sputnik V, afinal ainda preferem passar férias em Nova York ou Miami do que olhar para o Brasil profundo.