Por Fausto Frank.
George Soros, mega especulador financeiro nascido na Hungria, publicou uma extensa coluna de opinião no Wall Street Journal acusando o presidente chinês Xi Jinping de ser “o inimigo mais perigoso das sociedades abertas do mundo”, diferenciando uma China nacionalista, que ele reprova, de uma China globalista, que ele promove.
Em sua análise, o fundador das Fundações Open Society distingue a construção do poder interno de Xi Jinping, que ele define como “intensamente nacionalista” (sic), da estrutura de poder de uma China aberta à globalização, representada por “muitos membros da classe política e da elite empresarial”, que em sua opinião “podem se opor” à “intenção” do líder chinês de “quebrar o sistema sucessório estabelecido para permanecer como presidente vitalício”.
Segundo Soros, Xi Jinping “sabe que seu plano tem muitos inimigos e quer ter certeza de que eles não têm a capacidade de resistir a ele”.
Para o magnata financeiro, este confronto não é apenas uma contradição interna chinesa: ele também enfrenta dois blocos de poder globais, o que na prática poderia levar a uma guerra entre a China e os EUA. “Estas contradições internas foram reveladas no contexto do crescente conflito entre os Estados Unidos e a China (…) As relações China-EUA estão se deteriorando rapidamente e podem levar à guerra. Xi deixou claro que pretende tomar posse de Taiwan na próxima década e, consequentemente, está aumentando a capacidade militar da China”. Este cenário se intensificou este ano com o anúncio do presidente americano Joe Biden de um compromisso com a independência de Taiwan, um evento que “significaria guerra”, o governo chinês respondeu de forma oportuna. “Dizemos seriamente às forças pró-independência de Taiwan: aqueles que brincam com o fogo serão queimados, e a independência de Taiwan significa guerra”, disse na ocasião o porta-voz do Ministério da Defesa chinês Wu Qian. O People’s Daily, órgão de imprensa do PCC, levou uma mensagem do presidente para as tropas do Exército de Libertação do Povo em 10 de março deste ano: “Estejam prontos para o combate”.
Soros reconhece que ele mesmo foi um jogador-chave para trazer a China para a estrutura de poder globalista: “Estou ativo na China desde 1984, quando introduzi os reformadores do Partido Comunista na China a seus homólogos em minha Hungria natal. Eles aprenderam muito um com o outro e eu continuei a estabelecer fundações em ambos os países. Esse foi o início da minha carreira no que eu chamo de filantropia política.
A China globalista com a qual Soros sonhava era melhor representada pelo trabalho de governo de Deng Xiao Ping, aquele líder pragmático que governou o país asiático entre 1978 e 1989, e encorajou a abertura ao capital internacional, lembrado por sua frase “Não importa se o gato é preto ou branco”; desde que possa pegar ratos, é um bom gato (不管黑猫白猫,捉到老鼠就是好猫)”.
“Deng percebeu que o Ocidente estava muito mais desenvolvido e que a China tinha muito a aprender com ele. Longe de se opor diametralmente ao sistema global dominado pelo Ocidente, Deng queria que a China se erguesse dentro dele. Sua abordagem fez maravilhas. A China foi aceita como membro da Organização Mundial do Comércio em 2001 com os privilégios que vêm com o status de país menos desenvolvido. A China embarcou em um período de crescimento sem precedentes. Até lidou com a crise financeira global de 2007-08 melhor que o mundo desenvolvido”, de acordo com Soros.
Contra esse esquema de poder, “Xi Jinping dedicou sua vida a desfazer a influência de Deng sobre o desenvolvimento da China. Sua animosidade pessoal em relação à Deng desempenhou um papel importante neste contexto, mas outros fatores são igualmente importantes. Ele é intensamente nacionalista e quer que a China se torne a potência dominante no mundo”.
Em 2019. Soros havia criticado o então presidente americano Donald Trump porque “em vez de travar uma guerra comercial com praticamente todo o mundo, os EUA deveriam se concentrar na China” e pediu uma “ação dura” contra os grupos tecnológicos chineses Huawei e ZTE porque “se essas empresas conseguirem dominar o mercado 5G, elas representarão um risco de segurança inaceitável para o resto do mundo”, e acrescentou o outro alvo usual de suas críticas: “Tenho me concentrado na China, mas as sociedades abertas têm muito mais inimigos, e entre eles, sobretudo o Putin da Rússia”, disse Soros.
Desta forma, dois grandes modelos de Ordem Mundial (no sentido dado a este termo pelo agora quase centenário Henry Kissinger) são expostos.
O primeiro, apoiado por Soros, é um globalismo “dominado pelo Ocidente”, ou seja, o sistema financeiro ocidental, nucleado em Davos na esfera econômica (com os projetos delineados por Klaus Schwab e o Príncipe Charles do Reino Unido, como o Grande Reinício), e nas Nações Unidas na esfera política (com sua publicitada “Agenda 2030”), na qual a China “sobe dentro dela”, como ator preponderante, mas subsumido ao capital financeiro. A China seria, neste esquema, o destinatário privilegiado do investimento global.
O segundo, rejeitado por Soros, é um modelo multilateral de poderes soberanos, governado por governos “nacionalistas”, de natureza protecionista e com foco no desenvolvimento industrial interno, no qual os EUA e a China (mais a Rússia) seriam inexoravelmente (por interesses financeiros) colocados um contra o outro em competição para ser a “potência dominante”.
Publicado em KontraInfo em 17.08.2021.
Tradução JORNAL PURO SANGUE.