Uma parte expressiva da esquerda política dá sinais de migrar para algo que eles definem como nacionalismo. Um dos sintomas disso, em um aspecto mais visível, é um incremento das cores verde e amarela por partidos que tem no vermelho sua cor oficial. Trata-se de uma resposta ao bolsonarismo, movimento que, ao contrário do que muitos pensavam até bem pouco tempo, vem mostrando bastante resiliência.
Contudo, tal movimento político pretensamente nacionalista egresso da esquerda resume-se a criticar o caráter “entreguista” do atual governo, que mascara a desnacionalização da economia – que não começou em 2019, bom frisar – com um festival de bandeiras nacionais e lemas “O meu partido é o Brasil!”. Assim essa esquerda neonacionalista baseia o seu discurso na defesa das estatais e na crítica da política externa do atual governo de alinhamento com os EUA e os “valores ocidentais”.
A questão é que não que eles estejam errados nessas críticas, conforme o Portal Rubem Gonzalez e o JORNAL PURO SANGUE apontam há tempos, mas que o nacionalismo, como fenômeno político, significa muito mais do que isso. Para que se tenha um Projeto Nacional de Desenvolvimento, tal como preconiza Ciro Gomes, é preciso que ele esteja assentado sobre um sentimento nacional forte, calcado em uma identidade nacional com apoio e reverbero popular. Esta é a condição para o nacionalismo econômico se consolidar como item prioritário da agenda política, para além de um verde-e-amarelo de aparências.
Da mesma forma, em um mundo marcado cada vez mais pela forte competição interestatal, de nada valem os apelos nacionalistas se não se reconhece a importância de se valorizar o desenvolvimento das Forças Armadas, dos serviços de inteligência e do desenvolvimento da indústria armamentista.
Mas boa parte dessa mesma esquerda, ainda que adote um viés nacionalista, ao menos no discurso, parece não ter superado traumas do Regime Militar (1964-1985). Passou a semana anterior ao dia 7 de setembro último aflita com a possibilidade de um golpe de Estado. Denuncia a “militarização da máquina pública”, pelo número de militares com cargos de livre nomeação, mas se esquecem que, na Nova República, principalmente a partir do Governo Lula (2003-2010), tornou-se comum a utilização desses cargos por correligionários de partidos da base aliada e por sindicalistas.
De outro modo, de nada adianta denunciar o caráter entreguista dos militares na reserva que ocupam cargos-chave em estatais e ministérios se o entreguismo também viceja em servidores da Administração Direta e em celetistas de empresas públicas e docentes de universidades públicas, para citarmos alguns exemplos. Tal estado de espírito só aumentou nos últimos trinta anos, diante da hegemonia das ideias neoliberais no Brasil.
As forças políticas que venham a reivindicar o nacionalismo precisam incorporar o discurso da ordem, condição necessária para o desenvolvimento nacional, tal como a experiência brasileira no século XX, a partir de Getúlio Vargas, mostrou. Caso contrário, o nacionalismo se diluirá no imaginário associado ao atual governo, que se reveste de um viés político importado do Partido Republicano dos EUA, que a esquerda erroneamente associa ao “fascismo”.
Se o nacionalismo que queremos não se basear na identidade nacional, na valorização do processo de constituição do Brasil como nação (processo ainda em andamento) e na necessidade de estar apoiado nas Forças Armadas tal esforço não será nada mais do que um “nacionalismo de plástico”, perfeitamente moldável pelas poderes externos, interessados na briga interna, enquanto não se estanca a sangria das “perdas internacionais”, como diria Leonel Brizola.