
Por Felipe Quintas.
O assassinato de Shinzo Abe me lembrou o do ex-primeiro-ministro sueco Olof Palme (1927-1986). Assim como Abe fez ao criticar Zelensky e defender um maior diálogo com a China, mesmo tendo um histórico beligerante contra ela, Palme também desagradou os interesses dos donos do poder ocidental.
Em sua última entrevista, concedida a um canal grego de televisão dois dias antes de ser alvejado, Palme, em fevereiro de 1986, ao ser questionado sobre a Comunidade Econômica Europeia (antecessora da União Europeia e que já vinha se preparando para se torná-la), disse que a Suécia não tinha planos para entrar nela e que se preocupava com a supressão da independência nacional e com o grau de centralização da entidade.
De fato, após o assassinato de Palme, a Suécia prontamente deu entrada para aderir à Comunidade Econômica Europeia e liberou a entrada de bancos estrangeiros no país, que era proibida desde o século XIX. O país também se alinhou internacionalmente cada vez mais ao bloco OTAN, enfraquecendo a política externa independente que Palme havia construído ao enviar armas ao Vietnã contra os EUA e para a Palestina contra Israel e furar o embargo econômico a Cuba. A adesão da Suécia à OTAN hoje é consequência do que se iniciou em 1986.
O assassinato de Palme marcou simbolicamente o fim da Era Social-Democrata na Suécia e o início da sua decadência industrial, social e internacional, que a fez deixar de ser uma referência internacional e a se tornar insignificante. Tudo leva a crer que não será diferente com o Japão, se ele se mantiver atrelado à zona de influência ocidental. O assassinato de Abe, como o de Palme, não foi apenas para eliminá-lo fisicamente, mas para eliminar qualquer laivo de independência em relação aos comandos financistas e militares anglo-estadunidenses. O mundo hoje é bem diferente, e as chances de êxito do Império OTAN são cada vez menores.
A entrevista completa está no seguinte link. Palme também aborda pontos interessantes que certamente não agradaram o financismo ocidental, como a defesa da energia nuclear, a necessidade do emprego e do desenvolvimento econômico e o temor de que as novas tecnologias, se mal utilizadas, levasse ao aumento do desemprego e à perda da liberdade. Ele resume bem os pontos de vista de um velho social-democrata, desses que hoje não teriam vez e seriam chamados de jurássicos e fascistas.