Paulo Guedes hoje exercitou a sua vocação poética para dizer que a queda recorde do PIB em 9,7% no segundo trimestre “é como a luz das estrelas emitidas há milhares de anos” e que a economia brasileira irá se recuperar em “V”. Bom, verificando-se as declarações anteriores do ex-adicto em day trade e investidor risca-faca nos fundos públicos de pensão, é difícil uma boa apreciação de credibilidade em suas declarações. Vamos às peças no tabuleiro.
Se o Guedes ficar, o Bolsonaro vai acabar derretendo, porque não tem lugar nenhum do mundo que esse modelo que ele pratica e defende tenha funcionado, portanto, não tem porque ser diferente no Brasil. Até as moscas nas paredes sabem que nem o neokeynesianismo tímido do petismo não deu conta. Então, se o Bolsonaro derreter, ainda assim não é certo que se consiga algum meio de retirá-lo do mandato ou de formar uma frente com condições de ganhar no voto em 2022. De fato, ainda tem muita água pra passar debaixo da ponte.
A equação básica nem é muito complexa. Bolsonaro vem crescendo em popularidade e aceitação em função de inaugurar obras, pagar o auxílio emergencial e propor o aumento do bolsa família com conversão para o Renda Brasil. Para prosseguir nesta trajetória é necessário orçamento. Caso ele se mantenha com a diretriz privatista e fiscalista de Paulo Guedes, não haverá orçamento para Casa Verde e Amarela, Pró-Brasil, muito menos para a retomada da industrialização. Se ouvir seus ministros “prata da casa”, Rogério Marinho e Tarcísio Gomes de Freitas, haverá abertura pra captura de investimentos privados e dotação pública de recursos para retomada da economia. Para fazer isso, precisa negociar com o Congresso os mecanismos de extrapolação do teto de gastos por meio de emendas orçamentárias e outras ações que iriam compor o “por fora” do teto.
Hoje surgiu a notícia de que quase 20 executivos da XP estão de mudança para o BTG Pactual, seria o prenúncio de um retorno ao ninho de Guedes? O neoliberalismo primitivo de Paulo Guedes é o sonho de ongueiros e especuladores ambientalistas escandinavos, pois fará com que o Brasil e seu povo retrocedam à idade da pedra. Poderiam erguer uma estátua do ministro do teclado da Bloomberg em Oslo. Inclusive, hoje Bolsonaro publicou o Decreto nº 10.478/2020, alterando o Código de Conduta da Alta Administração Federal. Seria isso um mecanismo de prevenir eventuais estripulias especulativas de algumas autoridades contra o país?
O que é certo é que desses movimentos no tabuleiro que sairão as decisões que irão determinar o futuro do governo Bolsonaro e do próprios país. O importante é que desse caldo político e econômico saia uma proposta para o país de desenvolvimento nacional, redução de desigualdades e consolidação da democracia que não seja mais do mesmo reformismo neoliberal e extermínio progressivo da população que vimos nos últimos 30 anos. Tem que vir uma proposta de país que faça o povo se sentir trabalhando em conjunto por alguma coisa e que dê jeito de reverter o naufrágio econômico e a diminuição da qualidade de vida. Pode vir do Bolsonaro ou dos social-democratas, de quem for, mas virá de quem souber costurar o apoio das várias forças políticas heterogêneas e estruturais do país, e negociar com todo mundo. Criança birrenta fica de fora.