O Governo entregou ontem, dia 03/09/2020, a PEC 32/2020 que trata da Reforma Administrativa. Dentre as principais medidas deste dispositivo, destaca-se o fim do Regime Jurídico Único (RJU) para os servidores da Administração Direta e das autarquias e fundações. Pela proposta, a estabilidade no cargo, que contempla todos os servidores estatutários do RJU, estaria reservada aos que fariam parte das “carreiras típicas de Estado”, incluindo aqui diplomatas e auditores fiscais.
O foco da reforma é mesmo o chamado “enxugamento da máquina pública”, abrindo a possibilidade de os governos terem mais flexibilidade para demitir servidores. Isto com o intuito de facilitar o “ajuste fiscal”, consolidado em dispositivos legais já existentes, como a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Emenda Constitucional 95, que instituiu o Novo Regime Fiscal, o famoso Teto de Gastos. O mesmo teto que o Ministro Paulo Guedes, o mentor da PEC da Reforma Administrativa, usou para ameaçar Bolsonaro no caso de tentar medidas “desenvolvimentistas” e “populistas”, no caso de tentar pular a cerca da ortodoxia neoliberal.
Mas a PEC não afeta os servidores e candidatos ao serviço público, focados nos estudos para passar em um concurso público. Carreiras jurídicas típicas, como a magistratura e membros do Ministério Público, justamente a elite dos cargos públicos, em termos salariais, não serão afetados. Atuais servidores poderão manter seus direitos adquiridos, mas poderão não ter mais direito à progressão por tempo de serviço. Em alguns Estados, mas não na União, constituem os chamados triênios. Isto ficaria a cargo de outros dispositivos legais fora da PEC, mas ainda dentro do âmbito da Reforma Administrativa do governo.
O fato é que a tal Reforma – que também poderia ser chamada de “deforma” – também pode se tornar um instrumento de impedimento a políticas industriais. Primeiramente, alterando o caput do Art. 37 da Constituição, ao inserir o princípio da subsidiariedade como um dos rege a Administração Pública. Por outro lado, altera o Art. 173 inserindo um parágrafo sexto que impede o governo de fazer políticas de incentivo ou reserva de mercado em alguns setores da economia, afetando tanto estatais como empresas privadas. Instrumento sorrateiro que extrapola o que seria uma reforma administrativa.
Assim, de acordo com essas mudanças propostas, empresas multinacionais do petróleo poderiam questionar a reserva da exploração do pré-sal pela Petrobrás ou bancos poderiam questionar a política de crédito agrícola do Banco do Brasil. Já que Paulo Guedes se encontra impossibilitado de extinguir todas as estatais como deseja, pode usar tais instrumentos para drenar o poder das estatais. O que já vem sendo implementado com a “privatização branca” por venda de ativos que o PORTAL RUBEM GONZALEZ e o JORNAL PURO SANGUE já vem denunciando.
Como foi enviada ao Congresso, a PEC da Reforma tem o potencial de afetar não só os servidores, empresas estatais e mesmo privadas, mas mesmo a capacidade do Estado, por meio do Poder Executivo, em fomentar o desenvolvimento nacional, em contradição com o próprio Art. 3o. da Constituição. Legitimaria o entreguismo explícito da equipe econômica. O Poder Executivo teria capacidade diminuta em relação ao Legislativo e o Judiciário. O Estado tornar-se-ia um mero ente regulador, longe daquilo que o povo brasileiro espera dele.
Se o leitor ainda é um fanático seguidor do “ajuste fiscal”, o que une tanto o Governo Bolsonaro e o Grupo Globo – este que ultimamente vem esquecendo até do número de mortos diários pela Covid-19 – saiba que a tal reforma não impactaria neste ano ou nos próximos três anos, no mínimo, os gastos discricionários da Administração Federal com servidores. Guedes não tem como propor nada que afete os atuais servidores, nem mesmo os que ganham os maiores salários.
Além disso, cabe a todos lembrar que, em paralelo, o Legislativo está montando uma PEC que permitiria a reeleição dos atuais presidentes de ambas as casas legislativas, a Câmara e o Senado. Quem sabe quais os acertos que estão se dando entre Paulo Guedes e Rodrigo Maia, em nome do interesse comum de ambos?