Por Felipe Quintas
Gostando-se ou não do Velho Briza, não se pode negar que ele foi um dos últimos grandes políticos brasileiros com ideais sinceros e capaz de colocar o Brasil acima de picuinhas partidárias, em detrimento, às vezes, da própria reputação, como quando se colocou contra o impeachment de Collor.
O idealista, contudo, não fez das suas convicções desculpa para a inação. Governador de dois estados, o Rio Grande do Sul e o Rio de Janeiro, mudou para melhor a história de ambos e serviu de inspiração até para os adversários.
No RS, criou mais de 5.500 escolas, distribuiu terras, desenvolveu a agricultura canavieira criando a Agasa (Açúcar Gaúcho S.A.), construiu as hidrelétricas de Jucuí e Charqueadas, lançou o projeto da Aços Finos Piratini, ponta de lança do forte industrialismo gaúcho nos anos 70, fundou a Caixa Econômica do RS e, em parceria com os governadores de Santa Catarina e Paraná, o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Além disso, encampou a ITT e começou a estruturar a telefonia gaúcha, servindo de modelo para Carlos Lacerda fazer o mesmo no RJ com a CTB, transformada em Cetel.
No RJ, criou os CIEP – programa educacional, cultural, social e sanitário ao mesmo tempo –, que se tornariam modelo dos CEU da Marta Suplicy em São Paulo, o Sambódromo, a Linha Vermelha, encampou várias linhas de ônibus barateando seu custo, abriu várias frentes de crédito pelo Banerj à pequena e média agricultura no interior do estado e implantou o policiamento comunitário, reduzindo os furtos e assaltos em vários pontos da cidade.
Administrador público exemplar, as críticas mais comuns a ele são todas infundadas. Ele nunca proibiu a polícia de fazer operações contra o tráfico em morros, apenas exigia ordem judicial, que é o básico do básico num Estado de Direito. Tampouco incentivou a favelização do RJ, pois isso aconteceu em todo o país na época e a política de regularização dos lotes urbanos que ele praticou não diferia em nada da que já vinha sendo feita pelos governos militares com o Profilurb. As causas da favelização, aliás, não dependeram de nenhum governo específico e são mais complexas, mas por questão de espaço não caberia discuti-las aqui.
Brizola cometeu erros? Claro, como todo mortal. Ele se empolgou demais com o sucesso da Campanha da Legalidade e, involuntariamente, tornou-se um elemento radical e desestabilizador do governo Jango, o que depois ele mesmo reconheceu. Depois de 1964, cometeu o erro de tornar-se líder de guerrilha com o apoio de Fidel Castro, mas, quando viu que estava fazendo mais o jogo de Fidel que do Brasil, caiu fora e iniciou uma autocrítica que culminaria na sua adesão posterior, inscrita na Carta de Lisboa, a uma versão nacionalista da socialdemocracia, exatamente o que Jango propunha e ele não entendera na época. O que faz o gigante não é cometer erros, mas reconhecê-los e reavaliá-los para fazer diferente e melhor.
Este pequeno texto não faz nem pretende fazer jus a toda a contribuição de Brizola ao Brasil, mas levanta alguns pontos para que, no centenário dele, a sua obra e o seu legado possam servir de inspiração a um Brasil que perdeu a inspiração.
Estaremos orando. Deus é bom o tempo todo.