Por Alfredo Jalife Rahme.
“The Critic”, uma revista britânica próxima ao partido conservador no poder pergunta em sua primeira página: “E se a Rússia vencer?”, ao lado de um balão de “China em ascensão” tentando esvaziar o Tio Sam americano com uma baioneta, fazendo outra pergunta obstinada: “Pequim tomou o lado errado?”.
A revista procura colocar o ex-primeiro-ministro deposto Boris Johnson no Secretariado da OTAN, mesmo acusado de ter impedido as negociações de paz entre a Ucrânia e a Rússia.
No próprio artigo, “The Critic” afirma que em uma “verificação da realidade: a Rússia pode vencer”. Seu diagnóstico é simplesmente sombrio quando “as coisas vão piorar para a população da Ucrânia, com muitos mais milhares de mortos e o país levando décadas para se recuperar”, sugerindo que a anglosfera “deve saber o que quer tirar da Ucrânia (…) porque à medida que as coisas se desenrolarem, elas estarão a favor de Putin”.
Acontece que o modelo anglo-saxão de fazer guerra através de sanções, “introduzido por Londres e depois imitado por Washington”, não opera mais “efetivamente” diante da “ascensão da China” e enquanto “Moscou se prepara para uma guerra extenuante”.
Ele argumenta que os “objetivos” da “mudança de regime no Kremlin” e da “balcanização da Rússia” são “inverossímeis”, dado o “apoio de sua população à guerra”, quando as “sanções” fracassaram.
Hoje as linhas defensivas da Ucrânia estão desmoronando; os “russos estão avançando em amplos setores da linha de frente” e “a maioria dos fatores indica que é provável que a Rússia alcance algum tipo de resultado favorável na Ucrânia”, mesmo com a chegada urgente do armamento moderno da OTAN para apoiar Kiev.
A revista observa que “o potencial para conversações de paz foi envenenado pela linguagem desajeitada de uma plêiade de funcionários norte-americanos”, principalmente a Secretária de Estado Adjunta Victoria Nuland, que estava “profundamente envolvida nos bastidores das maquinações políticas da crise da Ucrânia de 2014” e que acaba de reforçar o discurso de que ela estava “muito grata por saber que o NordStream 2 é agora (…) um pedaço de metal no fundo do mar”. Outro “Foda-se a Europa” de Victoria Nuland!
Após as confissões da ex-chanceler alemã Angela Merkel – sobre a fraude do acordo de Minsk – e do ex-presidente ucraniano Petro Poroshenko à BBC – de que ele deu à Ucrânia oito anos para “construir uma coalizão global anti-Putin” – Moscou não tem mais confiança em lidar com os EUA e a OTAN.
“The Critic” destaca a angustiada afirmação existencial de Putin de que “o objetivo de nossos adversários estratégicos é enfraquecer e fraturar” a Rússia “porque acreditam que nosso país é grande demais e representa uma ameaça”, quando a “máquina militar” da OTAN provocou “caos e destruição na Sérvia, Iraque, Líbia e Síria”.
A revista observa que o atual diretor da CIA e ex-embaixador dos EUA na Rússia, William Burns, “enviou um telegrama em 2008 ao chefe das forças conjuntas dos EUA lembrando-lhe que a adesão da Ucrânia à OTAN é a mais gritante de todas as linhas vermelhas para a elite russa”.
“The Critic” argumenta que a “intervenção da Rússia na Ucrânia foi um ato de desespero e não de força”, adotando a tese do geopolítico americano John Mearsheimer, da Universidade de Chicago.
É impressionante que “The Critic” fulmine ferozmente – como “analiticamente asinino (sic)” – que os “interesses vitais” da Rússia não foram levados em conta quando hoje ela goza do “equilíbrio da determinação”.
A revista britânica não percebeu que a singularidade militar no teatro de batalha ucraniano foi superada por duas reviravoltas supremas: a desdolarização/fim da hegemonia financeira anglo-saxônica e a visibilidade de uma nova ordem multipolar.