Por Daniel Bispo
Na imagem que ilustra este texto vemos o Venino Pantoja, a maior embarcação de madeira navegável do Brasil, com quase 39 metros de comprimento. Este barco foi construído na Amazônia, pela mão de obra local, o que mostra que, mesmo sem investimento público, a Indústria Naval Brasileira segue produzindo. Porém isso pode estar por um fio com a aprovação de uma nova lei.
Sancionada pelo presidente Jair Messias Bolsonaro na última sexta (7/1), a lei 14.031/22, conhecida como lei do BR do Mar, dispõe sobre um programa que, em tese, “incentiva” a cabotagem — tipo de navegação que é realizada entre portos de um mesmo país.
Atualmente, somente empresas que tenham sede no Brasil podem operar os serviços de cabotagem em águas brasileiras. Essas empresas precisam ter navios próprios, sejam importados ou fabricados em território nacional, mas nenhum alugado de uma outra empresa estrangeira, a não ser que isso seja feito na proporção de metade da frota própria, com a substituição de toda a tripulação dos barcos alugados do estrangeiro por brasileiros.
Pela nova lei do BR do Mar, o mercado de cabotagem seria aberto a companhias sem frota própria, que poderiam apenas alugar embarcações estrangeiras. Além disso, as empresas não precisarão mais ter embarcações brasileiras. O presidente se mostrou tão anti-Brasil nesse ato que chegou a vetar o artigo que estabelecia que as embarcações teriam que ter tripulação composta por, no mínimo, dois terços de brasileiros em cada nível técnico do oficialato.
Em comparação com o mercado da navegação de cabotagem nos Estados Unidos, a legislação brasileira já era muito mais liberal. Nos EUA, a legislação que rege a navegação de cabotagem não permite que um só estrangeiro faça parte da tripulação, além de obrigar que todos os barcos que navegam pelos rios do país sejam de fabricação inteiramente nacional. Graças a isso, esse setor nos EUA emprega 600 mil trabalhadores.
O BR do Mar, ao permitir que barcos estrangeiros entrem deliberadamente aqui, pode quebrar ainda mais a Indústria Naval Brasileira, que já sofre pesadamente com a falta de crédito, investimento e subsídios. O Amazonas, por exemplo, será muito afetado, pois é o estado com o maior número de estaleiros de manutenção e reparos do Brasil, com aproximadamente 400 unidades espalhadas por todo seu território, empregando com qualidade milhares de homens e mulheres ribeirinhos.
Muito se fala na preservação da Amazônia, mas como preservar se os poucos empregos complexos da Indústria Naval tenderão a sumir? Há estaleiros em Belém e Manaus que chegam a empregar, de uma vez só, de 200 a 400 trabalhadores. Por exemplo, o estaleiro São João, em Manaus, que foi construído em 1937 e tem uma área de 55 mil metros quadrados, chega a empregar 350 trabalhadores, que, se não fosse por esse trabalho, poderiam estar se aventurando pelos garimpos do interior do estado.
No entanto, a destruição não vai começar com o BR do Mar; na verdade ela só vai se acentuar. Em 2020, os estaleiros do Amazonas ofereciam 4,8 mil postos de trabalho e um faturamento anual de R$2,6 bilhões. Apesar de expressivos, esses números nem se comparam ao que eram em 2013, quando a Indústria Naval Amazonense empregava 12 mil trabalhadores diretamente, quase três vezes mais que hoje.
Diante desse cenário de extrema preocupação, é fundamental que o Brasil possa voltar a valorizar sua Indústria Naval, pois se trata de um setor vital não só para nossa economia como também para nossa soberania.
Referências
- LINS, Nadja Vanessa Miranda et al. Construção Naval no Amazonas: proposições para o mercado. In: COPINAVAL, CONGRESO PANAMERICANO DE INGENIERIA NAVAL. 2009.
- https://www.abtc.org.br/index.php/noticias/noticias-do-setor/item/5788-falta-de-investimentos-impede-o-avanco-da-industria-naval-do-am
Olá,
Bom dia/Boa tarde/Boa noite.
A respeito desta matéria, o pior é ver a maioria dos meus colegas Engenheiros Navais e Mecânicos, que trabalham no setor portuário comemorando essa lei, apoiando essa lei, repetindo aqueles velhos chavões neoliberais: “Isso ajudará na competitividade dos produtos e das exportações do Brasil”. “Vai baratear o frete e o país aumentará seu PIB”, blá, blá blá…
Quando tento argumentar com lógica e razão, falando de emprego (empregos bem remunerados para eles mesmos, nas áreas de projeto, construção, manutenção, etc.), fluxo circular de renda na economia (por que um setor de transformação industrial é importante para gerar riqueza dentro do país fazendo o dinheiro circular em mais mãos), questiono o por que outras nações não fazem isso (EUA, por exemplo!, Ps.: a maior parte destes colegas adora Orlando, Miami e Nova York,”sic”!), dentre diversas outros argumentos, etc.., sou visto como um ser estranho, que quer ver o “atraso”. Eu sempre gosto de retrucar perguntando para eles quais nações do mundo desenvolveram-se exportando somente minério de ferro, soja, sacas de café in natura, etc…, mas não tem jeito, eles não querem perder tempo ouvindo, discutindo, pesquisando dados, etc.
Estão, na minha percepção, no modo de sobrevivência a qualquer custo, gerado por um ambiente de trabalho cada vez mais brutal, que exige que eles não pensem além dos muros da empresa, é tudo para e pela empresa, e a sociedade?, dane-se a sociedade!
Aqueles engenheiros, tecnólogos, técnicos mecânicos, soldadores, que poderiam estar trabalhando, e, com seu salário, ajudando a economia local se desenvolver (vide o caso dos estaleiros fechados no RS, e no Nordeste) gerando diversos empregos indiretos (padarias, papelarias, lojas de roupas, construção civil, materiais de construção, etc.), não são problemas deles. Infelizmente, o futuro para alguns deles e para seus filhos e netos será um carro de Uber. Triste.
Continuem com o bom trabalho em defesa do trabalho, do emprego, da família, e da nação brasileira e soberana.
Um abraço.
Ps.: Orgulho de ter aprendido a ser brasileiro e amar o Brasil através daquele velho gaúcho que veio de longe!