
Sem um acordo na reunião de cúpula entre a Rússia e a OTAN, a situação na Ucrânia permanece tensa. De um lado, a Rússia deixou claro que não vai aceitar a Ucrânia e a Geórgia, ex-repúblicas soviéticas, dentro da OTAN, ao passo que os dirigentes desta organização alegam que estes países são livres para se tornarem membros desta organização. A adesão deles seria questão de tempo, nas palavras do comandante-geral da OTAN Jens Stoltenberg.
Na Ucrânia, a guerra civil já dura quase dez anos, desde a revolução colorida que derrubou o governo de Victor Yanukovich no início de 2014, que ocasionou a guerra na região do Donbass e a transferência da península da Crimeia para controle da Rússia. Hoje, a Ucrânia é o país mais pobre da Europa, em situação de falência do Estado.
Historicamente, como parte do Império Russo, a Ucrânia nunca teve soberania, e o Estado ucraniano só foi reconhecido como tal na Revolução Russa, quando a República Socialista Soviética da Ucrânia foi incorporada à União Soviética. Dotada de terras férteis e um celeiro daquele país, a Ucrânia foi palco de conflitos entre a autoridade central soviética e os interesses dos produtores rurais quando a produção rural foi coletivizada.
Da Ucrânia vieram líderes soviéticos como Nikita Kruschev e seu sucessor Leonid Brezhnev. A dissolução da União Soviética, por sua vez, foi decidida pelos presidentes das repúblicas da Rússia, Boris Iéltsin, de Belarus e da Ucrânia, em final de 1991, em um acordo que foram definidos os contornos desses três países.
Na negociação, no final dos anos 1980, para o fim da Guerra Fria, o então líder soviético Mikhail Gorbatchev concordou com os EUA em retirar as tropas dos países do Pacto de Varsóvia e desmantelá-lo com a condição de que não haveria expansão da OTAN, a organização rival ao Pacto, para estes países. Política que foi abandonada a partir de 1997, quando Polônia, Romênia, dentre outros, passaram a fazer parte da OTAN. Nesses países do Leste Europeu foram sistemas de mísseis direcionados à Rússia, na medida em que a OTAN engajava-se na Guerra do Kosovo de 1999 contra a Sérvia, país historicamente aliado da Rússia.
Nesse sentido, cabe entender o porquê de Putin apontar uma linha vermelha na Ucrânia, dada a proximidade desta com a Rússia, fora o fato de que na Ucrânia há uma grande população que fala russo e se sente próxima da Rússia, sobretudo nas regiões do Donbass e de Donetsk.
Chama a atenção nesta celeuma que a crise estoure justamente no inverno do Hemisfério Norte, época em que a dependência do gás russo pelos europeus atinge seu ponto máximo no ano. Os gasodutos da Rússia para o restante da Europa passam pela Ucrânia (situação que os EUA dizem querer manter), enquanto o Nord Stream 2 que abasteceria a Alemanha passando pelo Golfo da Finlândia e Mar do Norte ainda não está operacional, por objeção de setores do novo gabinete de governo alemão.

Os EUA e a União Europeia, enquanto isso, ameaçam os líderes russos de sanções, ao passo que o Governo Putin pode ameaçar de maneira mais severa aumentando o preço ou mesmo cortando o fornecimento de gás. Medida que não afetaria Washington, mas sim as capitais europeias, sobretudo Berlim.
A Rússia, nessa questão, vem demonstrando posição firme, mas cabe perguntar se os EUA realmente fariam pressão por medidas mais rígidas contra Moscou, ainda que envolva uma ação militar. Se a Rússia encontra problemas no Cazaquistão, ao dar apoio ao governo local contra uma revolta do tipo revolução colorida, os EUA, por sua vez, estão em disputa com a China e tentam desesperadamente impedir que o Irã desenvolva armas nucleares. E ainda contam com a possibilidade de a Rússia aumentar sua presença militar na Venezuela e em Cuba.
Vale tudo isso pela Ucrânia?