
Por Raphael Machado, Nova Resistência.
O discurso de Biden na cúpula organizada com seus “aliados árabes” é tão arrogante que chega a ser inacreditável, mas revela bastante da mentalidade de sua elite e seu Deep State. Revela inclusive algumas de suas fraquezas psicológicas.
Biden afirmou que os EUA não sairão da região porque sair da região significaria deixar um vácuo que seria preenchido pela Rússia, pela China ou pelo Irã. É uma declaração de exposição do “aventureirismo” globalista dos EUA. Os EUA não estão ali para resolver um problema específico, “o terrorismo”, mas para impedir o fortalecimento de outras potências.
Ou seja, o espaço é disputado em uma lógica de manobras geopolíticas em que um dado Estado só pode ser visto como parte de uma “área de influência” dos EUA ou de inimigos dos EUA. Os EUA vão ficar porque querem permanecer sendo o hegemon mundial.
Agora, essa lógica também expõe uma deficiência típica da mentalidade “realista” dos geopolíticos estadunidenses. Não há nenhuma multipolaridade nos cálculos. A hegemonia estadunidense só pode ser substituída por uma outra hegemonia. Se a unipolaridade colapsar ela será substituída por uma bipolaridade temporária até que surja uma nova unipolaridade.
Os realistas leem o mundo assim porque eles também estão contaminados pela mentalidade progressista e historicista segundo a qual a “unipolaridade” surge como um desenvolvimento histórico natural e inevitável dos processos que se têm desdobrado nos últimos séculos.
Desnecessário dizer que está fora de cogitação a noção de que os países árabes possam querer, simplesmente, se reestruturar em uma Confederação ou Aliança que se afirme como polo autônomo. O imperialista lê tudo sob uma ótica imperialista. Os árabes tem que se curvar aos EUA para não terem que se curvar ao Irã, por exemplo.
A mentalidade norte-americana não é capaz nem mesmo de vislumbrar a possibilidade de relações ganha-ganha, não parasitárias e não exploratórias entre países mais fracos e potências regionais ou continentais. Como sempre, é claro, Biden insistiu na necessidade dos países árabes se submeterem à geopolítica expansionista sionista-israelense, na égide dos Acordos de Abraão. Dando mais um sinal de total desvinculação com a realidade, Biden então enfatizou a importância de que os países árabes respeitem os “direitos humanos” das mulheres e das “minorias”, sempre sob a ótica liberal e globalista e querendo passar por cima dos costumes e tradições dos árabe-muçulmanos.
Sinceramente, a mera necessidade de Biden se deslocar para enfatizar e declarar pontos que, até pouco tempo atrás, eram considerados autoevidentes expõe as fragilidades e rachaduras do projeto globalista americanocêntrico.