A retomada do controle estatal da Eletrobrás é uma pauta fundamental para a recuperação econômica do país.
A grande holding do setor elétrico brasileiro, a Eletrobras, foi privatizada em 2021, no governo Bolsonaro. Sendo já na época uma sociedade de economia mista, ou seja, controlada pelo Estado brasileiro, mas com capital privado e ações negociadas em bolsa, passou ao controle privado em uma manobra espúria do antigo governo, com aprovação do Congresso Nacional. Pelo acordo de privatização, a União perdeu o controle da Eletrobrás mesmo tento 42% do capital da empresa, pois segundo as novas regras impostas nenhum acionista poderia ter mais de 10% do capital votante ou mais de uma cadeira no Conselho de Administração, em um total de 10 cadeiras.
Pouco comentado na grande imprensa – e sob a anuência do Tribunal de Contas da União – criou-se uma aberração jurídica no Direito Empresarial brasileiro, em que um acionista, a União, não tem seus votos proporcionais nas decisões da empresa, mas responde proporcionalmente em caso de prejuízo. Claramente, uma medida lesiva ao patrimônio público, que deveria ser sustada pelo próprio TCU.
O governo Lula assumiu em 2023 com a promessa de rever o processo de privatização e, para isso, acionou a Advocacia-Geral da União para entrar com uma ação no STF. Este, por sua vez, na figura do ministro Kassio Nunes, indicado ao cargo por Bolsonaro, encaminhou o caso à Câmara de Conciliação da Administração Federal (CCAF), em dezembro passado. Até o momento, segundo a AGU, a União continua satisfeita com os rumos das “negociações”, mostrando-se mais satisfeita com uma decisão que não altere significativamente o quadro atual de desvantagem na Eletrobras.
É de se notar que o STF, que se mostra tão audaz em censurar e punir supostos autores de “crime de ódio” nas redes sociais ou em interferir na segurança jurídica no campo, no caso da votação sobre o Marco Temporal (contra o marco legal definido pelo Legislativo), se omita em uma questão tão importante como a Eletrobras, que é a base do sistema elétrico nacional.
Sobre a Eletrobras, cabe lembrar que não se trata de uma pauta de “esquerda” ou “direita”, mas de um dos pilares da economia nacional, que é capacidade de se gerar e distribuir energia com economicidade e eficiência. Criada em 1962, no governo João Goulart, a Eletrobras ganhou musculatura nos governos militares, como bem demonstra o cientista político Felipe Quintas em seu livro “Regime Militar: a construção do Brasil”, quando um sistema elétrico coordenado pela Eletrobras, com amplos investimentos em usinas hidrelétricas, conseguiu suprir a demanda por energia em um período de alto crescimento econômico.
O desmonte do setor elétrico, controlado diretamente pelo Estado, veio com a Nova República, no famigerado Governo FHC, justamente quando “apagões” de energia, antes inexistentes, tornaram-se frequentes, com os responsáveis pelo setor pondo a culpa nas condições climáticas. Com as “reformas” de FHC e a inclusão da Eletrobras no Plano Nacional de Desestatização, a holding perdeu o controle de várias distribuidoras de energia e de usinas geradoras.
Se o Brasil quiser retomar o rumo sustentável do crescimento econômico, faz-se necessário retomar o controle estatal da Eletrobras. Responsável pela metade dos reservatórios de água do país e quase metade da geração de energia hidrelétrica é pelo controle da companhia é que se diminuir os custos de geração e transmissão de energia, ampliando o investimento no setor, tendo em vista os crescentes custos que são repassados aos consumidores, sobretudo os pequenos consumidores residenciais, cativos de distribuidoras privadas de energia cada vez mais ineficientes, haja visto o casa da Enel e da Light, para falar de dois exemplos de grandes distribuidoras.
Conforme definiu o Professor Ronaldo Bicalho, do Instituto Ilumina, o processo de alienação da Eletrobras, começado na década de 1990 e finalizado em 2021, foi o “maior golpe da história da República”. Que a retomada do controle público sobre a empresa seja uma nova causa nacional.